Recebo a advertência de uma querida internauta sobre o post de ontem.
Ela é um dos meus amáveis e fiéis leitores, e diz que não é justo o que fiz com o Escova, um personagem de histórias sempre alegres.
— Você o largou em um bar numa fossa de dar dó. Não é justo para ele, e para os leitores que esperavam um daqueles causos divertidos do conquistador trapalhão que ele é.
Confesso que fiquei um tantinho enciumado.
A internauta sequer notou a minha presença naquela mesa de reminiscência.
Mas, nada a reclamar.
Manda quem pode, obedece quem tem juízo.
O blogueiro é refém das expectativas que ele próprio cria.
Não tenho outra alternativa se não lhes contar uma breve aventura do então jovem Escova nos tempos da velha redação de piso assoalhado e grandes janelões para a rua Bom Pastor.
Pois então…
Uma bela tarde chegou àquelas paragens uma Estagiária de fino trato e belas curvas.
Natural que todos crescessem os olhos.
Não havia santo por ali.
Escova era um dos nossos.
Portanto…
II.
Vida que segue.
Dia vai, dia vem… Todos de olho grande na moça – e ela na dela, diz que seu coração tem dono, e que namora há anos, e é a garota mais feliz do mundo ao lado do Pimpão.
III.
Tudo certo, nada resolvido…
Eis que numa noite de sexta-feira quente, como a de hoje, aparece, do nada, um jovem espumando de raiva, enfrentando os seguranças, xingando a tudo e a todos; mas, como só e acontecer, procurando pelo dito Escova.
Foi um perereco!
IV.
Acrescento que o nosso herói enfrentou galhardamente a situação, fazendo-se de desentendido. E assumindo a maior cara de paisagem.
Se bem me lembro, balbuciou algumas palavras de indignação com o balacobaco que estava acontecendo. E, com ar solene, disse aos seguranças:
— Levem esse rapaz, pois aqui é nosso sacrossanto lugar de trabalho.
V.
Logo apareceu a Estagiária, aos prantos, gritando para que o Pimpão parasse com aquilo.
— Não tem cabimento o que você está fazendo. Vamos embora.
VI.
Serenados os ânimos, todos se voltaram para o Escova a pedir explicações.
— Sou inocente, juro. Tudo o que fiz foi pedir a ela que apressasse o fechamento da coluna de teatro para podermos terminar a página de Variedades. Ela estava há horas falando ao telefone e atrasando tudo.
VII.
Por incrível que pareça, o argumento de Escova era real.
Ele era inocente – ao menos, nesta ocasião.
VIII.
Do outro lado da linha, o rapaz ouviu a cobrança feita pelo jornalista.
Ficou furioso – e voou de Pinheiros para o Ipiranga em minutos, para enfrentar o bruto que ousava falar assim com a sua lindinha.
Mas, a história não acaba aí.
IX.
Ainda naquela noite, no finzinho da jornada, a Estagiária liga para mim, que coordenava o fechamento da edição, a fim de explicar o malentendido.
O Pimpão andava muito ciumento.
Em seguida, ela pediu que eu passasse o telefone para o Escova.
Conversaram por instantes.
Escova, com ares de preocupação, dizia perdoá-la e que desse mais atenção ao namorado.
Óbvio que fingia…
X.
Para resumir a história, que já está longa para os padrões blogueiros, Escova e a
Estagiária tiveram um romance tempestuoso por anos e anos.
O Pimpão dançou legal.
XI.
Tempos depois, naquele boteco de sempre, cobramos do Escova porque ele havia mentido para nós naquele dia, dizendo que nada havia entre ele e a doce Estagiária.
Escova sorriu – e confirmou:
— Não tinha mesmo. Mas, posso lhes garantir que começou ali.
Como assim, perguntamos.
— Simples. Não requer prática, nem tão pouco habilidade. Se o cara ficou tão puto da vida só porque dei uma cortada na conversa dos dois ao telefone, é porque já estava invocado com alguma coisa, certo?
Concordamos:
— Certo.
— Se ele chega procurando por mim que nunca havia sido apresentado a ele, é porque alguém havia falado de mim para ele, correto?
Concordamos, outra vez.
E ele continuou, cínico e gabola:
— Quem poderia falar de mim para ele? Elazinha – e só ela. É fácil concluir: a moça estava na minha, só que no nível da admiração e tal. O ‘mané’ deu bandeira e jogou a linda no colo do Degas aqui. Daí foi só correr para os abraços, os beijos e viver uma linda história de amor.
XII.
No fundo, o Escova é um sentimental.
(•Escrevi demais. Volto no domingo…)