Eu tive um sonho.
Havia voltado aos meus tempos do Grupo Escolar Oscar Thompson.
Sobre o tampo da rústica carteira, eu espalhava os cadernos para a aula do dia.
As brochuras eram novas – e traziam a figura do Papai Noel na capa.
Fiquei apreensivo.
Desconfiei que aqueles cadernos não eram meus.
Nunca fui desses fricotes.
A garotada poderia zombar de mim.
Quis guardá-los rapidamente, mas aproximou-se uma mulher – que não era a Dona Izabel, nem a Dona Laura – e pediu que eu mostrasse “as tarefas de casa”.
Aí que eu me embananei todo.
Lembrei que havia passado a tarde toda jogando futebol no campinho da rua Piaí.
Fui salvo pela ‘linguagem experimental’ do meu sonho. Que, num corte seco, me deixou na rua Bom Pastor. Já era um rapazinho cabeludo e, à frente do Fefe’s Dog, esperava os amigos para terminar a noite no aeroporto de Congonhas, onde íamos tomar um café e dar uns bordejos.
Enquanto esperávamos chegar o Pachini e o seu possante Simca Chambord, era costume desandar a falar mal da vida alheia. Nosso alvo preferido era certa moça, lindíssima, que acabara de se separar do marido.
Naquele tempo, as desquitadas caíam na boca do povo. Baita preconceito.
No fundo, no fundo, todos nós ali tínhamos lá nossas ideinhas para com a moça que, como já disse, era lindíssima.
Outro corte seco no entrecho do sonho.
E lá estava eu frente a frente com a deusa que me cobrava explicações sobre o que se disse e o que não se disse na roda “de marmanjos desalmados”.
Fiquei sem graça – ainda mais que o sonho era meu e eu não sabia o que lhe dizer.
Resolvi não esperar o Pachini e despertei ainda querendo me explicar.
Olhei pela janela e vi o sol nesta bela manhã de domingo.
Fiquei duplamente aliviado. Pelo fim do sonho e dos dias de chuva.
** FOTO NO BLOG: Itália/arquivo pessoal