Foto: Joost Evers/Anefo. Françoise Hardy, em Amsterdã (Holanda), em 1969
…
Dos arredores de Paris onde vive seu auto-exílio, o amigo Escova me envia doída mensagem:
“Estamos cada vez mais viúvos de nós mesmos”.
…
Oxi.
Não entendo.
O bom repórter Escova, sempre tão direto e reto em suas manifestações, deu agora para falar por alegorias.
Viúvos de nós mesmos?
Como assim?
…
Minha apreensão logo se torna desalento assim que me chega no zap, também enviada pelo Escova, a triste notícia de que uma das musas da nossa geração, a cantora francesa Françoise Hardy, se foi no dia de ontem, aos 80 anos.
“Num mundo cada vez mais embrutecido, perdemos uma das raras referências de elegância e sensibilidade.”
…
Eu o entendo, amigo.
Sou solidário à sua prostração.
Há que se conviver com essas memórias.
…
Na ruidosa virada das décadas de 60 e 70, vivíamos a milhão entre sonhos, utopias e rock and roll.
De certa forma, o Planeta Música encampava as dores e delícias dos enfrentamentos diários e inevitáveis de jovens inconformados, como éramos.
No embalo das canções, tínhamos régua e compasso para traçar nossos passos na tal vereda da vida (que, diga-se, nos sorria e acalentava).
“É proibido proibir!”, quem aí se lembra?
…
Tantas e tamanhas turbulências, tantos e tamanhos os acordes pesados dos roqueiros do Steppenwolf, do Tree Dog Night, dos Stones, de Johnny Halliday; tantas e tamanhas as sinuosidades da psicodelia dos Beatles e mesmo os arroubos apaixonados da música italiana, surgia ela, a encantadora Françoise Hardy, com a elegância suave no cantar, a delicadeza e beleza lírica, única.
Éramos feitos de ternuras, digo ao amigo em nosso papo virtual.
…
Ouço a oportuna ressalva como resposta:
“Éramos envoltos em tolas e doces ilusões”.
Até o guru de todos nós, o Marcão, que via qualquer estrangeirismo cultural com olhar enviesado, gostava de ouví-la no rádio do seu possante Maverick.
Ele a chamava de Francisca.
Quando perguntávamos quem era a tal Francisca, a resposta era óbvia:
“A moça bonita que canta em frâncês”.
…
…
O que você acha?