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Frases e lembranças

Foto: Jô Rabelo

E eu corri pro violão num lamento
e a manhã nasceu azul
Como é bom poder tocar
um instrumento

Os versos de Tigreza, da música que Caetano Veloso fez para Sônia Braga em priscas eras, só fizeram real sentido quando os ouvi declamado por Raul Seixas.

Eu explico.

Após entrevista que concedeu a mim e ao amigo Clóvis Naconecy de Souza na sede da WEA em Pinheiros, Raul perguntou como era tocar o nosso modesto Jornal da Mooca, um valente semanário que tínhamos e circulava naquele bairro paulistano em 77/78.

— São 12 páginas, formato tabloide, 10 mil exemplares…

Antes que terminássemos a descrição, Raulzito caetaneou:

Como é bom poder tocar um instrumento.”

Outra frase que Raul disse nesse mesmo dia, e que me é inesquecível:

“É isso aí… O importante é que a gente deixe nossa impressão digital sobre o mundo.”

Desconfio – tenho quase certeza – que já lhes falei desse causo no Blog.

Creio que não se incomodam de, hoje, aqui revivê-lo pra dar início à esta crônica sem tema específico.

Afinal, o exercício do Jornalismo é um eterno revirar da mesma rotina.

A cada manhã, enfrentamos a vida como ela é.

Tão surpreendente no varejo, e tão igual no atacado.

Somos o que os doutores em Comunicação chamam solenemente de historiador do cotidiano.

Em outras palavras, Jornalismo é reportagem.

Esse refazer o que foi feito, reviver o que foi vivido, também nos proporciona um aprendizado raro.

Querem um exemplo ?

Quando escrevi o obituário sobre o escritor Jorge Luis Borges para a Revista Afinal, em 1986, descobri uma frase que me tocou profundamente – e ainda hoje faz a minha cabeça:

“A gente pode tudo nessa vida. Só não pode é fazer a si próprio infeliz”.

Em maio de 1998, dia em que Frank Sinatra morreu, ouvi contristado de um caríssimo amigo que acabáramos de assistir a um momento transcendental para a Humanidade.

– Nada mais resta, disse desolado.

Estávamos na Redação, e logo entendi o tamanho da tristeza do meu considerado, alguns pares de ano mais vivido do que eu. Ele lamentava os estertores de um tempo mágico para a sua geração. Um tempo que tinha como marco a explosão dos sonhos no pós-guerra. Um tempo emoldurado por ilusões fugazes made in Hollywood, pelo apreço ao estilo e elegância, por amores, densos exasperados e o sonho de sermos coletiva e individualmente verdadeiramente felizes.

Daí em diante, diante de algumas estranhezas da vida, não tive (e não tenho) qualquer pudor em adaptar a observação à minha maneira de ser.

“O século 20 acabou quando Frank Sinatra morreu”.

Hoje, tenho lá minhas dúvidas. Mas, ainda não mudei de opinião.

Se meu interlocutor estranhar minha fala distópica, então recorro inexorável ao grande Rubem Braga, jornalista e o cronista do Brasil lírico que ainda hoje almejamos:

“Eu sou do tempo em que todas as geladeiras eram brancas e todos os telefones eram pretos.”

Creio que, a partir daí, as dúvidas se esclarecem…

Mas se precisar, de um reforço, sapeco outra de Rubem Braga (foi epígrafe da minha dissertação de mestrado):

“Glória ao padeiro que acredita no pão.”

Um causo rápido:

Certa noite, lá nos antigamente, ao participar de uma colação de grau de formandos em jornalismo, fiquei feliz quando uma das oradoras da turma citou a dita-cuja frase em seu discurso de homenagem aos professores.

Mil e tantas vezes repeti a citação em sala de aula que, ao ouvi-la na voz da jovem formanda, fiquei todo orgulhoso e, juro, sinceramente, até pensei que fosse minha…

(A frase, óbvio)

Acho que já escrevi demais para quem não tinha assunto para o post de hoje.

Termino, pois, com uma frase de Sérgio Porto, antes de virar o irreverente Stanislaw Ponte Preta:

“A gente sempre se sente mais alegre da alegria que teve.”

Ainda nenhum comentário.

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