"Desse lugar é que lhe escrevo, de porta escancarada para o sol." (Alphonse Daudet)
01. Uma busca ao arquivo fotográfico de Gazeta do Ipiranga para ilustrar uma das reportagens da semana e, de repente, a curiosidade me impele a vasculhar a pasta Monumentos. Entre dezenas de fotos coloridas, tenho minha atenção voltada para uma imagem em preto-e-branco já um tanto esmaecida pelo tempo. E eis que reencontro (essa palavra tem algo de mágico, não?) o Castelo do Samaronne que situava-se, ali, entre as colinas do que hoje, em tempos urbanizados, entendemos como Moinho Velho. Ali, até o fim dos anos 50, tinha-se um recanto dos mais aprazíveis com muito verde e um grande lago, que abrigava em suas margens a sede do Clube Atlético Ypiranga…
02. Pois é. Nosso bairro não nasceu ontem. Dá para imaginar que o Ipiranga, um dia, foi assim? Difícil, né? Sequer pode supor quem olha o corre-corre de todo o santo dia; as ruas congestionadas, os prédios, toda a agitação e burburinho de um grande bairro de uma supermetrópole. Mas, foi esse lugarejo pacato e ávido por mostrar a força de sua gente que recebeu Gazeta do Ipiranga, em 26 de abril de 1958. E desde então adotou GI como legítimo porta-voz de suas aspirações e anseios. Uma relação de absoluta confiança entre as partes. Uma relação prestes a completar 42 anos de proveitosa existência.
03. Creio não ser imodesto dizer, agora que as águas de março já rolaram e olhamos com otimismo para o mês de nosso aniversário, que estivemos juntos nas grandes conquistas da região. A diretora-presidente de Gazeta do Ipiranga, Araci Bueno, participou da fundação do Clube dos Lojistas ao lado do empresário Zelindo Olivi e outros notáveis ipiranguistas. Vieram outros feitos. Ainda vejo as acaloradas discussões na então sede da Distrital do Ipiranga da Associação Comercial na Silva Bueno sobre as mudanças de mão de direção das ruas do bairro. O especialista Roberto Scaringela já era coordenador de trânsito de São Paulo e a manchete de GI à época registrava: "O Ipiranga amanheceu às avessas."
04. Outras campanhas também foram vitoriosas. O combate à poluição ambiental resultou na fiscalização mais contundente (e mesmo o fechamento) de empresas como a Coferraz, Usina Santa Olímpia e a Siderúrgica Aliperti. Inclusive a primeira página de Gazeta do Ipiranga denunciando as chaminés fumegantes foi transformada em cartazes de mão pelos moradores na manifestação contra a empresa. Outro exemplo bom de lembrar foi o mutirão contra as enchentes em Vila Cristália, assim como a luta para a implantação de melhoramentos públicos nas 32 vilas e jardins que formam o Grande Ipiranga.
05. É claro que há outras tantas — e boas — histórias para se contar. A mais memorável no entanto, foi a mobilização de todo o bairro em prol da redemocratização do País. Desde os primeiros dias de 84 nosso jornal acompanhou os preparativos para o grande comício pró Diretas-Já que reuniu mais de um milhão de paulistanos na Praça da Sé. Gazeta do Ipiranga abriu manchete com letras garrafais — Diretas Já! — e dedicou toda sua primeira página à histórica manifestação. Foi o auspicioso momento de uma vitoriosa luta.
06. Olha aonde foi parar nosso encontro de todas as sextas, a partir de uma velha foto do Castelo do Samaronne? Em meio aos transtornos do pittagate, da vergonha do salário mínimo e do desvario da equipe econômica sempre dizendo amém ao FMI; em meio à violência urbana a cada dia mais acintosa e a tanta notícia ruim que a mídia insiste em consagrar como espetáculo; em meio a tudo isso, creio que valeu a pena reviver momentos de um passado que nos é caro e fundamenta a história de todos os que vivem e constróem um Ipiranga melhor a cada manhã.