— Lixeiro, lixeiro…
A senhora saiu esbaforida pela calçada atrás do vulto de macacão surrado que, por sua vez, corria atrás do caminhão da coleta de lixo numa das pequenas ruas, atrás do Jardim da Aclimação.
— Parôparôparô… Parô geral…
Era o alerta meio gritado, meio cantado do rapaz franzino para os ‘colegas de trabalho’ já espetados na caçamba do “jamanta”, no dizer dos próprios tripulantes.
O caminhão foi parando de mansinho, sem grande alarido. Deu até para ouvir o estourar do saco de lixo que o moreno de vinte e poucos anos tinha nas mãos e arremessou certeiramente na boca do triturador de detritos.
A senhora agradeceu a gentileza. E justificou-se:
— Perdi a hora de colocar o lixo na rua. Muito obrigado.
Ele abriu um sorriso gentil e soltou a resposta:
— Não há de quê, dona. Só uma coisa, pra esclarecer bem. Não somos lixeiros. Somos coletores de lixo.
Foi a vez da senhora sorrir, sem graça. Ainda com o saco de lixo na mão.
— Lixeiro, dona, é quem produz o lixo.
Ele arrematou em tom professoral ao apanhar o material inservível da mão da legítima lixeira – pois, ela e os seus que produziram aquilo tudo – e, de primeira, carimbou a bagaça mais uma vez.
— Aêêêêê…
Aboiou para o motorista tocar para frente que ele iria atrás. Logo também estaria empoleirado no “jamanta” que outras ruas os esperavam.
II.
As estudantes de jornalismo queriam fazer uma grande reportagem sobre lixo reciclável.
Apertavam-se na cabine do caminhão para um primeiro contato com a realidade das ruas. Tiveram, ali, de graça e de quem menos esperavam, uma bela lição de vida que os livros não conseguem ensinar.
A reportagem ficou tão boa que virou trabalho de conclusão de curso. O livro reportagem chamou-se “Lixeiro É Você”, de autoria de Karina Fiorezi, Fernanda Sciascio e Renata Maria Martins.
III.
Lembrei da história porque hoje, 21 de outubro, é o Dia do Coletor de Lixo.
Um abraço fraterno para a rapaziada que pega no pesado. E um beijo saudoso às alunas que nunca mais vi…