— Nando, Nando.
Fazia sua habitual corrida pelas alamedas do Parque do Ibirapuera quando ouviu a voz de uma mulher a lhe chamar.
— Nando, Nando, Nando…
Insistia, ansiosa.
Acontece que ele não se chamava Nando, nem Fernando, menos ainda Ferdinando. Num acesso de tradicionalista convicto, o pai resolvera lhe presentear com o nome do avô e, acreditem ou não, desde que se conhecia por gente, atendia pelo nome de Gregório ou simplesmente Gregó, para turma das ‘peladas’ na quadra de society, toda quinta à noite, quando não jogasse o Timão.
— Nando, Nando… Nandôôôôô…
Alguém insistia e, mesmo às suas costa, não teve mais dúvidas: os chamamentos vinham em sua direção.
Parou, virou-se e deu de cara com a deusa mais linda de tantas quantas já se embrenharam por aquelas matas e trilhas.
II.
Não houve tempo para perguntar se era mesmo com ele.
Visivelmente constrangida, algo sem graça – mas, nem por isso menos linda – a moça (“Sofia, muito prazer”) desculpou-se:
— Me perdoe. Eu o confundi com um amigo.
Gregó adorou não ter cortado o cabelo como planejara naquela semana e ter uma nuca, digamos, tão comum.
Riram da confusão e, sem que se dessem conta, passaram a fazer o trajeto lado a lado.
Quem os via, assim à distãncia, rindo a conversar e trotar, imaginaria que formavam um belo casal.
III.
E não é que, desde então, formaram mesmo.
Tudo muito natural, e espontâneo.
Voltaram-se a se encontrar no Parque e fora dele. Trocaram números de telefones, endereços eletrônicos. Ela postou uma foto de ambos, felizes, a dividir a mesma água de coco. Até que o inevitável aconteceu. Logo houve mudanças no status do Face de cada um. Primeiro para “compromisso sério”; depois, quando passaram a dividir o mesmo apê, incorporaram o “casado”, sem qualquer remorso.
IV.
O tempo, aquele que não para no porto, não apita na curva, não espera ninguém (salve poeta Reginaldo Bessa, onde anda?), passou implacável.
Três anos depois, Gregó voltou a correr sozinho no mesmo Ibirapuera. Sofia aceitou ser ‘expatriada’ para Alemanha, pela multinacional em que trabalhava.
Relutou a princípio, mas depois se entusiasmou com a ideia de viver essa nova experiência.
Numa tarde em que andavam pelo Parque, sem a mesma naturalidade e discutindo a relação, um artista de rua deu a letra de a quantas a coisa ia entre os dois.
A letra do velho samba-canção, assim como o tempo, era contundente:
“Que o nosso caso está na hora de acabar”.
V.
A mãe de Gregó, uma senhora nos trinques da antiga aristocracia paulistana, nunca aceitou o romance entre o filho e “aquela doidivana”.
— Onde já se viu em tão pouco tempo, irem morar juntos – e sem uma cerimonia oficial de csamento?
(Pois é, sinais dos tempos, as mães dos rapazes que hoje se implicam com isso.)
Mesmo vendo a tristeza do filho, não perdoava. Desde o primeiro momento, percebeu que não seria para sempre.
— Começou errado, dá errado no final. É a lei da vida…
— Como começou errado, mãe? – perguntava algo irado Gregório (que na casa da família, não aceita ser chamado por apelido).
E a coroa, com ares de aparente sabedoria, tinha resposta imediata, com outra pergunta:
— Por acaso, você se chama Nando? Fernando? Ou Ferdinando? Então…