Gosto de contar minhas prosas.
Quem não gosta?
E uma das histórias que mais causam, quer seja em sala de aula, em palestras ou mesmo conversa com novos amigos, é a de que entrevistei um belíssimo time de cantores/compositores de música popular brasileira. De Caetano Velloso a Amado Batista. De Ivan Lins a Adoniran Barbosa. De João Gilberto a Sérgio Mallandro – que um dia gravou algo parecido com música (“Vem fazer glu glu”), fez algum sucesso e eu tive que entrevista-lo – registre-se, porém, o encontro foi divertidíssimo. Escrever a reportagem, nem tanto.
Faço sempre questão de deixar claro. Trabalhei quase 20 anos nesta área, num tempo em que eram comuns as coletivas de imprensa e tinha-se como obrigação este encontro artista e jornalista especializado para ambos os lados. Parece que havia da parte deles mais a dizer. Também as publicações eram mais generosas no espaço que lhes concediam.
Hoje, parece que andam cada qual para o seu lado. O jornalista prefere ficar com sua opinião. Ao artista, basta aparecer no Domingão do Faustão, e quem quiser que conte outra, vida que segue.
Enfim, este é outro assunto que, um dia, retomaremos, se vocês quiserem…
II.
Os “óóóóóós” mais prolongados ouço quando falo dos encontros com Raul Seixas (óóóóóó…) e Elis Regina (óóóóóó…). Os “ahahahahahahs” mais sentidos percebo ao dizer que entreguei a fita com a entrevista de Elis para um amigo decupar e, passado algum tempo, não soube mais do amigo e menos ainda da relíquia (aliás, contei essa história em “Minha Melhor Reportagem” no blog em 19/01/07). O bate-papo com Raulzito está no último capítulo do livro “Às Margens Plácidas do Ipiranga”, também disponível no site.
Um muxoxo de decepção fica nítido no rosto das pessoas quando conto que, dos tais e quais, só não entrevistei o Chico Buarque. Nas mulheres – e de todas as idades, hein! –, detecto um ar de quase-revolta ao saber dessa gravíssima falha em meu currículo. Falha indesculpável, mesmo ao alegar que escrevi sobre os discos mais importantes do moço, assisti aos shows, li o livro, coleciono os dvds. Imperdoável, parecem dizer; como se eu fosse apresenta-lo a elas no dia seguinte.
Também não é assim, né. Não sou nenhuma Marília Gabriela ou Jô Soares, mas me virei como pude no ofício de enfileirar letrinhas…
III.
A bem da verdade, toda essa introdução eu fiz por uma enorme saudade que hoje bate. Também por uma divida imensurável que tenho comigo mesmo.
Nunca entrevistei Nara Leão.
E este, sim, é um buraco na minha carreira. Nara foi uma intérprete sensível, uma artista visionária – como todo o artista deveria ser para poder usar esse título -, uma mulher extraordinária. Ícone da bossa-nova, deu voz e vez ao samba e à música de protesto, descobriu Maria Bethânia e, por conseqüência, Caetano Velloso, fez dupla com Chico nos tempos de festivais, intuiu o Tropicalismo e os caminhos pop da MPB ao gravar o brejeiro Meus Amigos São Um Barato.
Nara morreu no dia 7 de junho de 1989, aos 47 anos. Mais do que uma obra, deixou os caminhos abertos por onde trilhou a MPB de qualidade – essa que, de tanto a mídia esconder, a gente acredite que nem mais exista.
Se Nara e Elis (justiça, seja feita) estivessem vivas, não seria tão assim…
IV.
Quando for contar minhas prosas de hoje em diante, não esquecerei de dizer que entrevistei todos os grandes nomes da MPB, menos dois: Chico Buarque, que não lamento, mesmo sendo fã incondicional. E a bela Nara Leão, a mulher que reinventou a canção popular no Brasil.