Você pode achar este texto no ícone Caro Leitor.
Foi publicado em 24 de dezembro de 1998.
Vou blogá-lo hoje por dois motivos:
01. Para confirmar o que escrevi ontem aqui.
02. Porque gosto especialmente deste texto.
03. No fundo, no fundo, nada mudou.
Perdoem a imodéstia, mas a crônica me é atualíssima.
Tomara que gostem
* NATAL, O MENINO E O SONHO
Não sei se com você ocorre o mesmo. A cada ano que se encerra, tenho a desconfortável sensação de que mais depressa o tempo passou. Voou e voa num bater de asas imperceptível rumo a sabe-se lá o quê, a sabe-se lá onde. Pois, cá estou eu, surpreso, a escrever mais um Caro Leitor da Edição de Natal de nossa Gazeta do Ipiranga. Não reparei nas luzes made in China que enfeitam as ruas da cidade. Nem me liguei nas tais compras natalinas, festinhas de confraternização, cartões, mensagens, panetones e outras coisinhas que caracterizam o limiar de mais um fim-de-ano.
Creio andar mesmo absurdamente desligado. Esqueci até da brincadeira de amigo secreto (Em tempo, uma boa garrafa de vinho salvou-me de um embaraço maior). Parece que, assim como o Tempo e o Ano, também chega mais rápido o Natal nesses dias bicudos de globalização, crises, bolsas e violência. Aliás, até as guerras hoje padecem da mesma frugabilidade. À tarde, tudo pode estar bem. Mas, ao cair da noite, sem que o mundo saiba exatamente o porquê, caças bombardeiros cobrem o céu de um distante país e surgem trágicas luzinhas verdes desta feita, Made in USA, a reverberar que os poderosos de plantão chutam para o espaço os ditames da paz.
Houve época que não era assim…
Na primeira infância, o Natal era a festa mais esperada por todos. Demorava imaginários séculos para chegar. Mas, quando vinha, trazia avós, tios, primos e alguns diletos amigos. Ao lado dos pais e irmãos, divagavam esperanças e encantos ao redor da mesa farta, do presépio circunspeto onde pastores e magos fingiam caminhar entre serragens e pedras feitas de papel para encontrar a choupana encimada por uma estrela-guia. Ali, à meia-noite em ponto, nasceria o Salvador. Todos comiam, bebiam e cantavam alegres modinhas napolitanas.
— Ano que vem, não quero bagunça.
Havia sempre uma tia a se exasperar por conta do pileque do marido ou da travessura dos filhos. Mas, era desculpa de ocasião. Natal seguinte, estavam todos reunidos. E comiam, bebiam e cantavam. Repetiam o fascínio da hora dos presentes e dos abraços efusivos, emocionados, alguns até alegremente chorosos. O dia seguinte era a ressaca para os adultos e o exibir dos novos brinquedos para a gurizada incontrolável em tempo de festa. Entrava o novo ano e recomeçava o ciclo da vida. O garoto fixava os olhos no calendário comportado do Empório Santo Antônio. Calculava, talvez em conta-gotas, quanto tempo faltava até o próximo Natal, a festa do Menino Deus. E da esperança de felicidade para o menino que ainda acreditava no sonho, nas pessoas e na magnitude do 25 de dezembro.
Caro leitor, vale resgatar o menino, o sonho e a fé em um futuro promissor.
Vale resgatar o Natal.
Seja feliz.