Leio hoje, nos Cadernos de Cultura, sobre o perfil dos membros integrantes da Academia de Cinema, os tais responsáveis pelas escolhas dos vencedores do Oscar anualmente. São senhores brancos, e idosos – acima de 60 anos.
Não se preocupem, caros e fiéis cinco ou seis leitores destas modestas linhas, não estou postulando a inclusão de meu nome entre os notáveis. Tenho as características supracitadas, sim, mas passo longe do cinéfilo apaixonado – aliás, como eram meus saudosos amigos Ismael e Nasci.
Em noite de Oscar era dia de risadaria geral na velha redação de piso assoalhado.
Inevitável a discussão ambos para listar os melhores do ano, com antecedência.
Colunista de TV e de Cinema, Isma era o responsável pela reportagem sobre o evento, mesmo que à distância.
Nasci, pelo seu passado de glória como produtor nos áureos tempos da Record, dava seus pitacos na premiação.
Logo apareciam os conflitos de interesse – e nosotros, cada qual batucando em sua Olivetti, éramos convocados pela dupla para arbitrar esta ou aquela escolha. Logo toda a tropa parava o que estava fazendo para gaiatamente palpitar na matéria do Ismael.
Esquecia-se a política local, o futebol, a reivindicação dos moradores… Esquecia-se de tudo, atrasava-se a edição, tudo em função da noite do Oscar.
Certa ocasião, para por ordem na casa e devolver a consciência a todos os presentes, o sábio Escova – o único ausente da polêmica, pois tinha uma namorada nova e estava louco para “fechar” o jornal e ir ao encontro da amada – não teve dúvida em proclamar a manchete da então combativa Gazeta do Ipiranga.
Para se fazer ouvir, ele subiu na mesa de madeira escura – e solenemente pediu a palavra:
— Pessoal, do jeito que vocês estão discutindo a reportagem do Ismael, deixo minha sugestão para a manchete do jornal e vou indo porque tenho um compromisso inadiável, com a minha Pierina.
Largou a lauda caprichosamente datilografada na mesa do editor – e partiu.
Na lauda, o deboche em três linhas:
MORADORES DO IPIRANGA
SAÚDAM VENCEDORES
DO OSCAR DE 1979
Tivemos uma crise de consciência e voltamos ao nosso trabalho, sem glamour e tapete vermelho.