Envio um email para o amigo Nestor, que mora em Bruges na Bélgica, para saber de notícias. Afinal, a coisa foi tão traumática ontem em Bruxelas – os atentados, 31 mortes, mais de 130 feridos, a tragédia anunciada. Que o mundo ainda hoje está perplexo e afundado na dimensão do terror, do ódio e da intolerância.
Por via das dúvidas, sou direto na mensagem:
“Você está bem?”
Horas depois, recebo a resposta em tom de desabafo.
“Assim, assim… Nada aconteceu comigo. Vivo em Bruges, e só saio daqui quando há absoluta necessidade. Na idade em que estou, a única pressa que tenho é a de voltar para casa e lá ficar com meus bolachões (discos) e meus livros que, por sinal, são bem antigos. Leio e releio as mesmas obras, nada do mundo de hoje me atrai. Sou quase um ermitão, lembra nossa conversa em Lisboa? Pois então…”
Replico o email:
Mas, e as coisas por aí, como estão?
“As ruas estão vazias. O comercio, às moscas. Quem tem algum compromisso e precisa de algum transporte público, pensa dez vezes em qual horário deve ir e vai com passo acelerado e coração saltando pela boca. Aliás, já vivíamos assim desde os atentados de Paris ou até antes quando essa ameaça começou a rondar as grandes cidades europeias. Há quem pense que o povo daqui, do continente, já enfrentou duas grandes guerras. E sabe se manter de cabeça erguida mesmo diante desses enfrentamentos. Percebo, no entanto, que a cada nova tragédia, como a que ontem aconteceu em Bruxelas, nos sentimos ainda mais desamparados. E entregues à própria sorte – ou seria mais acertado dizer, ao nosso próprio azar de encontrar um homem-bomba por perto.”
Vi nos telejornais que autoridades das grandes potências europeias se manifestaram prontamente em defesa dos cidadãos e das sociedades democráticas contra o terror. Falam em recrudescer os sistemas de segurança pública e que a luta será longa.
Escrevo para que confirme o que representa toda essa mobilização.
Ele responde:
“Retórica, pura retórica. Palavras que o vento leva. Eles estão tão aturdidos quanto nós. Os atentados de ontem eram mais do que esperado. Todos sabiam que aqui funcionava um QG do EI ou algo do gênero. No entanto, nem o serviço secreto, nem qualquer esquema de espionagem e segurança conseguiram evitar a morte de tantos inocentes. Não falo só em incompetência. Fomos nós mesmos que nos enfiamos nessa enrascada. Quando o ódio e o fanatismo se juntam, é inevitável o descontrole, o caos”.
Pensei em perguntar ao Nestor se pensava em voltar ao Brasil, mas reconsiderei a partir das suas palavras finais e me despedi com um formal: “Fica com Deus, irmão. Tamos juntos”.
Ele me respondeu, com lacônico “Amém”.
(E olhem que o Nestor é agnóstico.)
NOTA:
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