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O Brasil

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Olho o mapa da distribuição dos votos presidenciais – e concluo:

São dois Brasis.

Irreconciliáveis?

Não sei.

Talvez.

Só as próximas gerações poderão nos mostrar.

Mas, dependerá – e muito – do que hoje fizermos.

E qual o caminho pretendemos seguir:

o da esperança ou o do ódio?

o da solidariedade ou o do preconceito?

o da democracia (com respeito e fortalecimento das instituições cidadãs) ou o do autoritarismo obscurantista?

Lembro ter entrevistado uma famosa cantora nos idos dos anos 80.

Ela devia estar num bom dia. Porque continuamos a conversa informalmente depois que desliguei o gravador.

Falante, ela dizia-se entusiasmada com o lançamento do novo disco e, principalmente, com a temporada em âmbito nacional que estava prestes a iniciar.

Uma aventura sair por esse país de tanta diversidade.

Parou de sorrir por instante – e fez a observação:

“Tem muitos perrengues também”.

Fez outra pausa – e acrescentou:

“Existem muitos brasis dentro do Brasil”.

E se pôs a enumerar os contrastes, os regionalismos, as culturas, as condições sociais de cada região.

Não fez qualquer juízo de valor.

Mas, fez questão de ressaltar:

“Por vezes, você se imagina em outro planeta até. Mas, o bonito de tudo o que lhe falei é o amor e o orgulho que essa gente tem de ser brasileira. É de emocionar.”

Resgato essa historieta do limbo do esquecimento ao me defrontar, na tarde de ontem, com o discurso separatista de dois pacatos e encapotados senhores (como eu, de cabelos grisalhos) à beira do balcão da padaria onde este humilde e faminto escrevinhador foi comprar o pãozinho nosso de todo o dia.

Falavam para que todos ouvissem, me pareceu.

Destilavam preconceito, um tom amargo e outras bizarrices.

Uma tentativa de doutrinar quem eventualmente ouvisse a falação?

Ou simples desabafo?

Pode ser, mas não garanto.

A conclusão dos senhores diante do embasbacado rapaz que os atendia era simples:

“Temos que dividir o Brasil”.

Fiquei algo indignado.

Não. Na verdade, diria que me senti desalentado diante dos falastrões.

Felizmente, ninguém ali lhes deu plateia.

Seria um erro grotesco cair na débil provocação.

Foi o moço do caixa que deu a deixa falando em tom coloquial:

“Já começou o segundo turno, doutor”.

Oportunas palavras.

(Soube que o dono da padaria orientou a todos os funcionários não abrir a boca sobre política.)

Só a caminho de casa, a bordo do meu saquinho de pães quentinhos, pude entender que o que está em jogo é bem maior do que a disputa do Planalto.

É a construção de um Brasil múltiplo, inclusivo, solidário onde se faça a justiça social. Um Brasil fraterno, contemporâneo e verdadeiramente de todos os brasileiros.

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