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O dia em que o leitor informou o repórter

"Torcida amiga, bom dia."

01. Era assim que ao longo de mais de 40 anos o saudoso cronista esportista, Ary Silva, começava sua coluna sobre futebol nos jornais paulistanos, Diário da Noite e Diário de São Paulo. Ary Silva foi também um dos pilares da implantação dos jornais de bairro em São Paulo. Era diretor-presidente da Gazeta da Zona Norte, onde semanalmente dava seu testemunho sobre as coisas do Planeta Bola. Até poucos dias antes de sua morte, que ocorreu ano passado, o velho jornalista, primeiro presidente da Associação dos Cronistas Esportivos do Estado de São Paulo, cumpria dignamente sua missão de informar e formar o prezadíssimo leitor.

02. Lembro de Ary nesta manhã de sexta-feira para dar o tom otimista à coluna. Hoje, sabemos nós, ocorre o inusitado: você leitor está mais bem informado do que pobre escriba que fica a teclar essas linhas com um olho no peixe e outro no gato. Penso em lhe falar de algum outro assunto que não seja Copa do Mundo (até porque não sou chegado às artes da adivinhação e, portanto, não sei o resultado do jogo Brasil e Inglaterra), mas o coração acompanha o baticum dos dedos a imaginar a quantas andará (andou) nosso escrete no primeiro grande — e real — desafio do Mundial. O jogo foi realizado às 3h30 (horário de Brasília) na cidade de Hamamaya no Japão.

04. Mais do que lhe passar informações atuais — que é dever e função de todo jornalista — hoje sou eu que dependo de seus esclarecimentos. Não resisto e lhe faço uma série de perguntas, caríssimo leitor. São indagações existencialistas, fundamentais para a felicidade plena de todo e qualquer cidadão brasileiro. O Brasil ganhou? Se sim, quem foi o melhor jogador em campo? O Ronaldo Fenômeno fez algum gol — e agora é líder isolado da artilharia? E o Rivaldo, o homem das chuteiras brancas, fez a diferença como nos jogos anteriores? O Ricardinho saiu jogando desde o início? O Felipão continuou cabeça-dura, vendo o jogo que ninguém vê?

05. Responda, leitor, responda… Copa do Mundo é mesmo uma agonia. Quer dizer, uma grande emoção. Mais do que qualquer outro evento. Mais do que Olimpíada, muito mais. Com o advento da globalização, a festa — sim, basta olharmos para o turbilhão vermelho que assola a Coréia para compreendermos a magnitude da festa — está se tornando cósmica. Imagino que nessa toada logo logo teremos torneios intergalácticos. Exagero? Sei, não. Quem diria há alguns que entre as oito melhores seleções do mundo estariam Coréia, Turquia, Senegal e Estados Unidos?

06. Bom que assim seja. Somos bombardeados diariamente com tragédias de todo tipo e feitio que, não é raro, passamos a desacreditar nas pessoas e no futuro. Sei que negócios, grana, interesses nem sempre saudáveis rondam e agitam uma Copa do Mundo. Mas, é inegável que ver esse congraçamento entre os diversos povos e etnias faz com que recuperemos um naco de fé e outro tanto de esperança na raça humana. Há nesses tempos uma certa força lúdica no ar. Uma força capaz de atrair bilhões de telespectadores, fazer nações tremerem. O futebol tem esse dom. De nos fazer mais humanos, rigorosamente iguais perante às regras do jogo. Não há grandes, nem pequenos. Ricos e pobres. Vencedores e vencidos. Mesmo se a derrota (toc, toc, toc) nos tirar da Copa, é inevitável: já estaremos sonhando com a de 2006, na Alemanha. O sonho recomeça… E o sonho é imprescindível para o milagre da vida. Por isso, seja qual for o resultado da turbulenta madrugada, repito sonolento leitor: "Torcida amiga, BOM DIA!"

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