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O longo caminho da democracia

Foto: Manifestação de ontem na avenida Paulista/Roberto Parizotti.

A chuva deu uma trégua na pacata São José do Barreiro aos pés da linda Serra da Bocaina.

Aproveito a manhã para dar uma esticada na praça central.

Caminho lentamente.

Entro na igrejinha matriz, uma relíquia de 1881, para uma breve oração.

Admiro a imagem de Santa Rita de Cássia, a santa das causas impossíveis.

Imagino que a representação também seja dos primórdios da igreja.

Pergunto ao rapaz que, ao que parece, cuida do santo lugar.

Ele me diz que não sabe desde quando a santinha está ali.

“Mas, é antiga pra caramba”.

Imagino que seja mesmo.

Ainda na praça, vou à padaria, compro pão, tomo um café de bule e estico até a loteria.

Faço uma fezinha na mega-sena.

Quem sabe a sorte não me sorri?

A moça que me atende me alerta: dois dos números escolhidos saíram na extração de sábado.

“Difícil que saiam de novo hoje”.

Acho sensato o comentário.

Mesmo assim, por preguiça e cisma, insisto nas seis dezenas de sempre.

Repito:

Quem sabe a sorte não me sorri?

Volto para a praça, escolho um banco para fazer uma horinha e, digamos, refletir sobre o que hoje lhes escreverei.

Foto: Arquivo Pessoal

Penso no zap que recebi, ainda na manhã de domingo, do amigo Nestor que mora na Bélgica, mas está em Roterdã neste início de ano.

“Trabalho não escolhe hora e lugar, amigo” – ele escreve.

Depois me conta, algo eufórico, que a TV pública holandesa fez uma cobertura impecável da posse do presidente Lula no domingo retrasado, 1° de janeiro.

“Foi mesmo de emocionar, não?”

Pergunta – e ele mesmo responde:

“Uma festa da democracia. Nosso país voltou à cena internacional em grandíssimo estilo”.

Não preciso dizer, mas digo: as mensagens do amigo me tocaram profundamente.

Algo em mim, porém, barulhava quando as li que deveríamos conter o entusiasmo – e atentarmos para os riscos que nos rondam.

Bolsonarentos propagavam, até então impunemente, uma convulsão social e a (re)tomada do poder.

Não soube – ou não quis – dizer ao amigo dos meus temores.

Talvez ele me julgasse o cético da vez, o estraga prazer…

À tarde ocorreram aquelas cenas devastadoras.

A escória invadiu e depredou o patrimônio público, danificou grotescamente obras de arte e bens culturais.

Seguramente essas imagens torpes e vis percorreram o mundo.

Porém, e sempre existe um porém…

Ao contrário do que supunham nossos desprezíveis algozes, elas não nos fragilizaram – e, sim, reforçaram, diante do mundo e de nós mesmos, a força de nossa democracia.

São provas disso as manifestações de ontem em todo o País contra os atos golpistas e antidemocráticos.

Ainda há um longo caminho pela frente.

DEMOCRACIA é construção contínua,

Embates fortes, e nunca definitivos.

O mundo todo parece acossado pela estupidez da extrema direita.

Como chegamos a esse grau de egoísmo e boçalidade, é uma instigante pauta para os sociólogos e analistas da sociedade.

De barato, ouso dizer: os tais Donos do Poder e seus lacaios de várias estirpes e olivas procedências, que odeiam pobres, desvalidos e pautas inclusivas, assustam-se todas as vezes que o país se insurge e ousa sonhar ser o Brasil de todos os brasileiros.

Enfim…

Hora de retomar o caminho de casa.

Me esperam para o almoço.

Sou um senhorzinho de passos claudicantes, mas ainda firme na defesa dos valores que sempre me acompanham.

Sem Anistia!

Democracia para sempre!

Foto: Ricardo Stucker

Ah…

Se o amigo Nestor perguntar sobre as minhas impressões em relação triste episódio de domingo, dou-lhe a mesma resposta que acabo de ler na coluna do Josias de Souza no UOL.

Leiam também:

“Lula presidiu uma reunião que parecia impensável. Sentado ao lado dos chefes do Congresso e do Supremo Tribunal Federal, recebeu governadores e representantes de todos os estados, inclusive os de oposição. Não tinham nenhuma reivindicação. Num desagravo coletivo à democracia, foram prestar solidariedade um dia depois do atentado bolsonarista contra os Três Poderes.

Depois, percorrer um salão destroçado, Lula e os convidados desceram a rampa do Planalto e atravessaram a Praça dos Três Poderes a pé, para inspecionar as ruínas do plenário da Suprema Corte. O Capitólio bolsonarista de 8 de janeiro produziu uma improvável união nacional em torno da defesa da democracia. O aval coletivo ao resultado das urnas funcionou como uma segunda posse para Lula.”

Ainda nenhum comentário.

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