Dei início hoje, com um seleto grupo de estudantes de jornalismo da Universidade Metodista de São Paulo, ao projeto de Oficina de Leitura que se intitula “A Crônica”, com encontros semanais (dez), sempre às quartas, das 11 às 12 horas.
O convite me foi feito, semestre passado, pelo professor José S. Faro, que coordena o projeto das “oficinas” que se propõe a incentivar nossos jovens – e futuros – jornalistas à leitura das grandes obras da Literatura que, por um motivo ou outro, não constam do currículo acadêmico.
A iniciativa é das mais louváveis – e, a mim, coube o desafio de fazer com que a moçada mergulhe no mágico universo deste gênero entre o jornalismo e as Letras, entre o relato e o conto.
Para muitos, trata-se de um gênero indefinível.
Diz o grande Luiz Fernando Veríssimo, talvez o mais representativo cronista dos
nossos dias:
“Crônica é tudo aquilo que se quer que seja”.
II.
O que se entende hoje por crônica tem origem nos primórdios do jornalismo brasileiro, com os chamados “folhetins” em que autores consagrados como José de Alencar, Machado de Assis, Joaquim Manuel de Macedo, entre outros tantos e tamanhos perambulavam sem qualquer constrangimento nas publicações da época.
É Literatura, então?
É Jornalismo?
Vamos lá!
Devagar com o andor que a conceituação não é tão simples, se é que existe:
A crônica prima pelo efêmero.
Mas, porém, contudo, todavia…
Ao longo do tempo, também se revela, quando de qualidade, perene e reflexo de uma era.
Ela, que habitou jornais e revistas ao longo de décadas (seu auge diria que andou ali pelos anos 50 e 60) hoje se espalha, trôpega e desacanhada, por pelas múltiplas plataformas digitais e, vez ou outra, pelas redes sociais.
III.
Podemos chamar um post de crônica? O blog é o novo espaço da crônica? O tuiter é uma crônica sincopada?
Sim e não. Não e sim.
“O tempo é uma convenção do relógio” – escreveu Mario Quintana, poeta e cronista; talvez o primeiro a tuitar em letras de formas e impressas, num tempo em que não havia redes sociais e as pessoas se preocupavam com o texto e o estilo.
Também conversaremos sobre os pontos comuns e as diferenças entre um cronista e um colunista.
Existem?
IV.
Para roteirizar nossos encontros, vamos usar como referência o livro As Cem Melhores Crônicas, com organização e introdução do jornalista e cronista Joaquim Ferreira dos Santos, publicado pela Editora Objetiva, em 2007.
“A crônica não quer abafar ninguém, só quer mostrar que faz literatura também. Textos feitos para o momento e que, pela qualidade, vão ficar para sempre. Eis o breque deste livro (e se o autor me permite, das nossas oficinas). As cem crônicas e os 62 autores que transformaram um gênero, chamado de ora de menor, ora de literatura de bermuda, num chorilho interminável de grandes clássicos de referência de bons momentos de nossa língua”.
Outra referência de nossos encontros: o estudo A Crônica, do professor Jorge de Sá, da Universidade Federal Fluminense, publicado pela Editora Ática, em 2005.
Deste trabalho, vamos extrair significativa parcela da estrutura da nossa caminhada.
V.
A cada oficina, faremos a leitura de uma ou duas crônicas e, a partir delas e do contexto em que se inserem, haverá as discussões e os comentários.
A ideia é a valorização do jornalismo autoral. Na contramão dos ditames da imprensa contemporânea.
Diz Carlos Heitor Cony:
“A imprensa moderna, altamente competitiva e cara, não chegou a mutilar o gênero, mas direcionou-o à estratégia geral do que hoje se chama “comunicação”. Numa palavra: exige que tudo o que é veiculado no jornal ou revista, das condições do tempo ao desempenho das bolsas, seja aquilo que nas redações é chamado de “serviço”.
(…)
“Antes de ser um leitor, o consumidor de jornal é um ser humano tornado carente pela solidão, pelo egoísmo (próprio e alheio), pelo nenhum sentido da sociedade como um todo. Quando um cara tem coragem de gritar que está sofrendo, fatalmente encontra alguém que o compreende e, algumas vezes, o ame. Isso não apenas samba. Dá uma crônica também.”
Quarta que vem, em mais…