Eu só quero que Deus me ajude
E o menino muito mais também
Pois a rosa é uma flor
A flor é uma rosa
E o menino não é ninguém
(Benjor)
I.
Olha o menino…
Ele mora em frente ao Shopping Higienópolis.
Não é um bem nascido qualquer; mora em uma pequena barraca, sozinho, na calçada em frente a um dos pontos mais luxuosos de São Paulo.
Tem 15 anos; mas, ainda é uma criança, diz a reportagem que leio.
Orgulha-se de ter “toda a coleção do Toy Story”.
Seu mundo está ali – dentro e nos arredores do modesto abrigo de lona.
O repórter é observador – e pondera:
“Não lhe falta nada. Pelo menos, nada que sinta falta”.
No texto, dá a entender que, mesmo em um bairro de bacanas (que lamentaram a provável construção de uma estação de metrô, pois deixaria o lugar muito popular), o menino conta com a solidariedade dos moradores.
Só naquele dia, que o jornalista o encontrou, o garoto almoçara três vezes (comida que as pessoas lhe trouxeram) e, a barraca, ele ganhou de um rapaz que desceu de uma BMW em uma tarde de chuva.
II.
O menino é de uma pequena cidade no Interior do Estado do Rio de Janeiro (Cachoeira do Macuco) e é a terceira vez que foge para a metrópole paulistana. Chegou a morar em uma árvore, também nas imediações do shopping. Mas, a mãe descobriu seu paradeiro e veio buscá-lo.
Foi em agosto passado.
III.
Não demorou, e logo o garoto voltou.
Pegou carona em um caminhão de tomates – e agora está feliz que só.
Olha o movimento, dá bom-dia e boa-noite às pessoas que (surpresa!) lhe respondem, mexe e remexe seus brinquedos, e assim vai levando como se estivesse no comando de tudo e de todos.
Imagina-se em um mundo encantado.
Seria ele um anjo torto, mensageiro da paz nesses dias de intolerância e desalento?
IV.
Talvez tenha algo a nos ensinar.
Talvez seja apenas um menino travesso, e sonhador.
O cronista não tem qualquer resposta. Mas, lembra outro verso bem bonito da canção de Benjor, diz adeus e vai embora:
“Há seis mil anos o homem vive feliz fazendo guerra e asneiras
Há seis mil anos Deus perde tempo fazendo flores e estrelas”
*A partir da reportagem Meu Mundo Na Barraca, de Emílio Sant’anna, na Folha de S.Paulo, de quarta, dia 5.