“O amor quando acontece
A gente esquece logo
Que sofreu um dia”
Os versos da canção de João Bosco ainda ressoavam em sua cabeça quando chegou ao auditório para participar da tal palestra da empresa. O quarentão Antero não vivia lá um grande momento em termos pessoais. Especialmente porque, com o fim do casamento, um tanto traumático, sentia-se assim, como direi, um tanto fora de jogo. Sem coragem para enfrentar novos relacionamentos.
“Mais pra lá do que pra cá”, como dizia aos amigos que insistiam em tirá-lo da sozinhez e levá-lo para as baladas da vida.
É certo que a galera não abria mão de provocá-lo.
– Vamos, Antero, mas, quando for apresentado às minas, não diz que chama
Antero que elas vão lhe chamar de tio… avô.
Nessa toada, Antero preferia a rotina casa/trabalho, trabalho/casa. Mas, aquela palestra institucional era forçar demais a barra. Ninguém merece tamanho palavrório.
– Tanta coisa pra fazer por aqui – e a gente lá, de bobeira, ouvindo platitudes e utopias. Sou capaz de dormir, e passar vexame.
(Esqueci de dizer que Antero tinha certo verniz no vocabulário. Era um tanto ‘coxinha’ e desconfio que foi isso que fez com a mulher caísse fora. Mulher alguma aguenta o seu lindo-lindão logo pela manhã saudá-la com frases do tipo: “Que esplendorosa noite de amor tivemos ontem!”)
II.
Mas, voltemos ao auditório, onde o palestrante palestrava em voz morna e pouco inspiradora enquanto Antero lutava para não sucumbir a um embriagador cochilo.
Decididamente não dava para prestar atenção no que dizia o senhorzinho de terno escuro de riscas brancas.
Vislumbrou algumas fileiras a sua frente uma moça de perfil lindo. Era Viviane que virara o rosto para conversar com a colega ao lado. Ele a conhecia dos corredores da empresa e de outros seminários. Cumprimentavam-se, sorriam e só.
Mas, sentia que havia uma ‘sinergia’ entre ambos,
(Falei que o cara era rebuscado no linguajar).
Gostou da ideia de estar tão perto dela.
III.
Saboreou o momento e se pôs divagar sobre a expectativa do que poderia vir a ser. Sentiu-se levezinho e algo feliz.
Não tardou a concluir que Vivi era a razão do tudo e do nada.
Indiferente aos sonhos de Antero, o discurso do palestrante continuava arrastado e sem fim.
Se não fosse a moça, certamente teria arranjado uma desculpa para escafeder-se dali.
Talvez o sono já o tivesse derrubado da cadeira, invadido a mente e a alma.
O coração, não.
O coração, Antero descobrira agora, já estava ocupado pelos encantos de Viviane,
IV.
Agora era se fazer notar e, na primeira oportunidade, lhe dizer do mais esplendoroso sentimento que ora lhe acalentava sonhos e devaneios.
Antero, decididamente, fazia jus ao nome de poeta e trovador…