Sign up with your email address to be the first to know about new products, VIP offers, blog features & more.

Pioneiros do rock *

Volto a ser instigado pelo amigo Marcelo para falar dos primórdios (gostaram?) do rock no Brasil. Ele me pergunta se conheço Carlos Gonzaga e se tudo começou ali, quando o cantor gravou a versão de “Diana” e fez um enorme sucesso. Isso no fim dos anos 50, início dos 60.

Não foi bem assim, digo.

A cantora Nora Ney foi a primeira a gravar a um rock por aqui. Em 1955, ela interpretou a versão de “Rock Around The Clock” (“Rondas das Horas”) para surpresa geral, pois era uma cantora de dolentes sambas-canções, como “Ninguém É de Ninguém”.

No auge da fama, Cauby Peixoto também incluiu no repertório a sacudida “Marina”, também uma versão, para o que então se dizia chamar “música para a juventude”.

Mas, nem um dos três – Gonzaga, Nora e Cauby – podem ser considerados roqueiros.

II.

A primeira geração a se identificar com o gênero – e se reconhecer como roqueiros – reúne nomes como Ronnie Cord, Meire Pavão, Tony Campello, Celi Campello, Sérgio Murilo, Demétrius, Wilson Miranda, entre outros menos cotados.

Por essa época, esses jovens intérpretes emplacaram sucessos inesquecíveis (como “Rua Augusta”, “Biquíni de Bolinha Amarelinha”, “Banho de Lua”, “Estúpido Cúpido”, “Ritmo da Chuva”, “Corina”, “Marcianita”, “Domingo de Sol”, “Oh! Carol”) e provocaram a aparição nas rádios do disk-jóquei especializado no gênero. Programas como “Os Brotos Comandam”, de Luiz Aguiar, na rádio Bandeirantes, era um dos líderes de audiência.

O rádio era o grande veículo de comunicação da época. Os musicais na TV eram tímidos e sua repercussão, idem.

Publicamente, esses artistas participavam das chamadas ‘caravanas dos artistas’ que percorriam as cidades do Interior, com shows em cinemas e teatros nos finais de semana.

III.

Normalmente, quem capitaneava essas excursões eram disks-jóqueis ou mesmo alguns emergentes apresentadores de TV. Exemplo: Abelardo Barbosa, o Chacrinha, manteve sua caravana durante muitos anos, mesmo no auge do seu programa na Globo.

Era, como dizem, uma mão lavando a outra. O apresentador divulgava a música no programa dele e o artista era uma das atrações da caravana. Todos faturavam e eram felizes.
IV.

Vale dizer que a meninada aí de cima não trazia em si qualquer traço de rebeldia juvenil. Mesmo a letra de um dos primeiros hits, “Rua Augusta” – ‘entrei na rua Augusta a 120 por hora’ – era mais uma alegoria do que propriamente retratava a realidade da época. Seu autor era um cinquentão, maestro Hervê Cordovil, pai de Ronnie Cord, o intérprete – a saber, no registro de nascimento, Ronaldo Cordovil.

Caras e bocas de James Dean passavam longe desse pessoal, quando muito suas atitudes proclamadas em filmes como “Juventude Transviada”.

O máximo que os rapazes se permitiam era caprichar na brilhantina para segurar um empinado topete, à la Elvis, sobre a testa. As moças não iam além da meia soquete e dos banhos de Lua, propostos pela canção de Celi Campello.

“Biquíni de bolinha amarelinha tão pequenininho” era mais promessa do que atitude.

Tempos ingênuos, de sucessos rápidos que se sucediam e se substituíam implacavelmente.

V.

A década de 60 era mesmo uma era de mudanças.

Logo quatro cabeludos de Liverpool trouxeram um novo layout para sonoridade dos jovens.

Trouxeram também outras novidades: o fim do topete e o aparecimento das madeixas longas para os marmanjos.

Tinham também um jeitão iconoclasta de se trajar.

A princípio, foi um furor menos avassalador do que o surgimento, anos antes, de Elvis Presley – penso que nem os jovens daqui os entendiam direito.

No entanto, os Beatles se revelaram um fenômeno, digamos, mais duradouro.

VI.

Foi inspirada mais nesses e mais remotamente em Elvis que, aí sim, surge a segunda geração do rock tupiniquim.

O grande diferencial se dá quando a música popular brasileira ganha a cumplicidade da televisão.

As transformações aparecem com o sucesso do primeiro festival da canção na TV Excelsior. Revela ainda uma cantora esfuziante, Elis Regina, entre outros de uma geração inigualável.

A partir daí, sim, se dá o terremoto cultural. Que não deixa pedra sobre pedra sobre o estabelecido e o convencional.
VII.

O que tem a ver Elis com o rock?

Calma meu senhor, calminha senhora minha, não abandonem este humilde narrador logo agora que nos encaminhamos para o post final da série “Pioneiros do Rock”:

Explico:

A TV Record resolveu apostar em musicais para sua grade de programação.

Amparou-se, para tanto, na engenhosidade dos membros da chamada Equipe A (Tuta, Nílton Travesso, Manoel Carlos e Raul Duarte) e começou tomando para si as rédeas da organização dos festivais (de 66 a 69). Outro passo foi a contratação de Elis Regina para comandar um programa de TV, com os bambas da emergente MPB.

Outra bola dentro. Sucesso imediato.

VIII.

Na sequência, o Sr. Imponderável de Almeida (salve Nélson Rodrigues) agiu forte. Uma inesperada pinimba com os clubes e a Federação Paulista de Futebol deixou vago o horário das transmissões dos jogos do campeonato paulista nas tarde de domingo.

O que fazer?

IX.

Outro lance de genialidade.

A Equipe A passou a cogitar um programa para os jovens e adolescentes que, das quatro a seis das tardes de domingo, tinham como programa obrigatório as matinés dos cinemas da cidade.

A encabeçar a parada de sucesso da época, um roquezinho maneiro que relacionava, um a um, quem era os tais cantores da juventude de então. Seu intérprete era um grandalhão de voz tímida, Erasmo Carlos, e a canção “Festa de Arromba” seria inclusive o nome do programa.

X.

Vejam o que é o destino.

Chamaram Erasmo para conversar e fazer uns testes de fotogenia. Queriam ver como ele se saía diante das câmeras.

Erasmo deu conta do recado.

Mas, ao final da conversa, fez uma proposta aos seus interlocutores:

— Posso trazer um amigo, também cantor, para comandar o programa comigo?

XI.

O amigo em questão chamava-se Roberto “Calhambeque” Carlos. Até que cantava afinadinho. Tinha um olhar triste e uma empatia imediata como público feminino.

O programa mudou de nome.

Passou a se chamar Jovem Guarda – e, a história que veio a seguir, todos nós sabemos…

Verified by ExactMetrics