– Que tanto você escreve, Carlos?
Carlos sou eu.
A pergunta, da Dona Yolanda, minha saudosa mãe.
Nas manhãs de domingo, acordávamos, tomávamos café e eu a levava para a sala onde ligava a TV para que ela pudesse assistir à missa que a TV Cultura transmite diretamente da Basílica de Nossa Senhora aparecida, n o Vale do Paraíba.
Na sequência, vinha o programa Viola Minha Viola, com apresentação de Inezita Barroso. A mãe fazia questão de assistir/ouvir.
Mais ouvia do que assistia desde que a degeneração das retinas dos olhos se agravou e a Dona Yolanda passou a enxergar muito pouco, quase nada.
Era o que mais a afligia.
– Só vejo vultos, enxergo cada vez menos, filho.
Preocupava-se com a falta de ar, com a pressão, com o coração frágil, com as dores nos ombros. Mas, reclamar, reclamar mesmo, era com o fato de estar perdendo a visão.
Mesmo assim, ela ia tocando sua vidinha, de um jeito simples, entre orações e as preocupações com os filhos e os netos.
– O mundo anda muito violento. Cada uma que acontece…
Por isso, não gostava de ver outros programas de TV,
– Só falam de tristezas.
Nas manhãs de domingo, eu ligava a TV e saía de fininho para o escritório. Tinha (tenho) o compromisso de escrever a crônica para o Blog – e nem sempre o texto sai de primeira.
Quando minha ausência se prolongava – e ela percebia (quase sempre já no horário do programa do Boldrim, Senhor Brasil), a pergunta, em tom de cobrança, era inevitável:
– Que tanto você escreve, Carlos?
Afora o fato de ser jornalista, por opção e fé, nunca soube o que lhe responder ‘que tanto que eu escrevo’.
Como hoje, quando o amigo me convidou para um café rápido, na padaria, e eu disse que não podia:
“Estou atrasado com o texto” – justifiquei.
“Que tanto você escreve, cara?” – me perguntou ingenuamente o meu interlocutor.
Lembrei-me da mãe.
E a saudade cortou fundo minha combalida alma.