“Em briga de elefantes, quem sofre é a grama”.
A frase é emblemática e se ajustou perfeitamente para definir em que condições foram presos, torturados e um deles assassinado, Vladimir Herzog, onze jornalistas nos idos de 1975, nos porões do DOI-CODI, em São Paulo.
Seu autor, o jornalista e escritor Rodolfo Konder, era um deles.
Em várias ocasiões, ouvi a explicação de Konder – inclusive na vez que o entrevistei quando era secretário municipal da Cultura de São Paulo, em meados dos anos 80.
Konder morreu na quinta, aos 76 anos.
II.
Voltemos àquelas infelizes horas de outubro de 1975.
As Forças Armadas (que comandavam o País com mão de ferro) estavam divididas em duas facções. Quem estava no governo, liderados pelo presidente Ernesto Geisel e pelo chefe da Casa Civil, general Golbery do Couto e Silva, apostavam na distensão e na transição com segurança. Já os que ansiavam chegar ao Poder (sempre o Poder), com Frota, Ednardo e tais, queriam que tudo continuasse como estava. Os militares à frente do País, sem espaço para a tal abertura democrática.
A virulenta ação contra os jornalistas em São Paulo, desencadeada por grupos paramilitares, com a conivência do comando regional, era uma tentativa de desestabilizar o grupo rival. Mostrariam assim o quanto eram lenientes com o que chamavam de ‘comunização’ do jornalismo da TV Cultura – a maior parte dos jornalistas presos eram funcionários da estatal.
III.
Anos depois, Konder narrou a angustiante situação vivida pelos presos políticos no corredor da sala da tortura em tocante conto, chamado Mocassins Pretos.
Os presos ficavam encapuzados à espera da chamada para o depoimento. No corredor que dava acesso a sala da tortura, o rádio no último volume tentava abafar os gritos de quem estava apanhando, levando choque; de quem estava sendo humilhado. Ao chegar um novo preso, Konder olhou por baixo da folga do capuz. Reconheceu ali os sapatos do colega Vlado a caminho do suplício, a caminho da morte.