A dor arremete.
Penetra-lhe no peito, expande-se poderosamente.
O Capitão fica de pé, os olhos muito abertos.
Um som chega-lhe aos ouvidos, um som agudo, distante a princípio, depois cada vez mais perto: uma sirena?
— É Sofia, com a polícia!
Está cercado.
Sofia e os policiais invadirão a casa pela porta da frente, a quadrilha entrará pelos fundos: resta saber quem o pegará primeiro.
– No pasarán – grita o Capitão.
Então, percebe que, se alguma esperança ainda existe, ela está no povo, em todo o povo: Sofia, os policiais, Libório, Nandinho, Hortênsio, Fuinha, os choferes, Português, Colomy, os corretores…
É para eles que o Capitão Birobijdan grita:
— Companheiros, iniciamos agora a construção…
Vacila.
Apóia-se no sofá.
As luzes se acendem.
É para frente que o Capitão cai.
Mergulha no mar escuro.
• Trecho do livro O Exército de Um Homem Só, escrito em 1970 pelo médico e escritor gaúcho Moacyr Scliar que faleceu, neste domingo, em Porto Alegre.