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Ser ou não ser (cronista)…

Não sei como, onde e por que me entendi cronista, a partir de determinado momento de minha passagem pelas redações.

Não sei também se posso me considerar ‘cronista-cronista’.

Acho que esta condição ganha consistência quando começo a blogar (diariamente) em setembro de 2006. Antes tinha uma coluna (Caro Leitor) semanal em um jornal de bairro paulistano (Gazeta do Ipiranga) no momento mais auspicioso deste gênero jornalístico em Sampa.

Meus cinco ou seis amáveis leitores talvez queiram entender o que eram os jornais de bairro nas três últimas décadas do século 20. Pois bem, vou lhes dar uma única informação: a Gazetinha chegou a ter edições de 54 páginas e tiragem na casa dos 60 mil exemplares.

Ali – e em outras redações de jornais paulistanos – trabalhei como repórter (especialmente na área de cultura), redator, editor; até secretaria gráfica eu fiz. Mas, era escrevendo a coluna que eu me sentia mais à vontade.

Ali, reitero, eu me sentia um tantinho mínimo próximo do que foram os grandes nomes da Imprensa brasileira que reverenciava e ainda hoje reverencio – Rubem Braga, Mário Quintana, Fernando Sabino, Carlos Heitor Cony, Diaféria, Raul Drewnek; todos cronistas.

II.

Todo esse intróito tem lá sua razão de ser e de estar.

Um amigo me perguntou o que exatamente quer dizer a expressão que cunhei, há algum tempo e que dias atrás repeti aqui no blog, sobre ser ‘um cronista de jornal sem jornal’.

— Não é a mesma coisa?

Sim e não, respondo.

A internet é uma plataforma de comunicação bem generosa, tipo coração de mãe.

Cabe tudo. No blog, por exemplo, é possível desenvolver diversos estilos de linguagem, inclusive a crônica.

Já no jornal – onde é o habitat natural da crônica e do cronista -, o que se preza é o texto no ritmo de conversa de amigo, a cumplicidade para comentar o detalhe do dia a dia, o olhar mais alongado para o que poucos veem.

III.

Outro ponto é que o público leitor de um jornal é supostamente fidelizado. Até por força das assinaturas, todos os dias as mesmas pessoas leem o mesmo jornal e assim se acostumam com este ou aquele escriba.

Já a internet, meu Papai, o mundo gira e parece aportar na nossa baia eletrônica, sem qualquer controle. Mês passado, o maior número de páginas visitadas deste modesto blog veio da cidade de… Amisterdã. Neste mês, até o momento em que batuco essas letrinhas, recebi mais visitantes da Alemanha do que do Brasil, pode?

Na web, pode, Explica-se?

Nem tudo tem explicação nos dias de hoje.
Continuemos, pois, o papo de ontem…

Como dizia, nem tudo tem – ou precisa ter – explicação nos dias de hoje.

Vão para ad cucuias, na internet, todos aqueles axiomas que, em priscas eras, fundamentaram o Jornalismo. Inclusive – e principalmente – aquele que define notícia por meio do simpático exemplo que caninamente ouvíamos e reverberava nas redações antigas e barulhentas.

Parece que vejo o velho Marques, óculos a equilibrar-se na ponta do nariz, a nos ensinar: o cachorro morder o rabo é comum, faz parte. Já quando o rabo morder o cachorro aí, sim, é notícia.

II.

No vale-tudo que hoje prevalece, sobram mistérios.

Um deles – o mais chinfrim deles, creio – é como este humilde de cronista de jornal sem jornal resiste e sobrevive no improviso do blogueiro.

Querem um exemplo, dada chinfrim e dos mais gratificantes?

(Aguardem cenas dos próximos blocos.)

III.

Semana passada, relatei em um post (ui!) em que relato, com (in)certa emoção, o meu encantamento e as minhas reflexões diante de uma criança solitária em uma caixa-de-areia em parque de São Paulo.

O garoto, com sua pazinha de plástico colorido, fazia, desfazia e tornava a fazer (o que imaginei ele imaginasse ser) um castelo de areia.

Pois vejam o que aconteceu…

IV.

Dias depois, o blogueiro/cronista recebe em seu email pessoal um vídeo de uma linda garotinha (dois anos, se tanto) a reproduzir a mesma brincadeira em uma praia nos Estados Unidos.

Em bom português, a zelosa mãe (que não aparece em cena e não me autorizou a divulgar o vídeo) faz a pergunta:

– Está fazendo um castelo, filha?

E a menina, docemente contrariada, responde:

– É casinha mãe!

V.

Para o blogueiro, uma conquista considerável (mesmo sabendo que, no mundo virtual, os Estados Unidos sejam logo ali).

Para o cronista, algo descrente, lavado e enxaguado em tantos e tantos dias de chuva, uma emoção inenarrável.
Não sei foi (e ainda é) a conversa que tivemos nesses dois últimos posts. Sobre crônicas e cronistas.

Sei que acordei, de madrugada, pensando na frase do saudoso Zé Jofre naqueles idos de 70 quando cheguei à redação de piso assoalhado e grandes janelões para a rua Bom Pastor.

“A crônica – dizia ele – é um dos raros espaços no jornal onde a emoção sobrevive”.

“Por isso – profetizou – é um gênero que tende a desaparecer”.

II.

Tonico Marques e Zé Jofre eram velhos resistentes, originários da Imprensa ideologizada dos anos 40 e 50. Trabalharam nos principais jornais de esquerda paulistanos, combateram o bom combate até que o Golpe de 64 os tirou das redações. Mesmo assim continuaram a luta, fundando jornais de bairro e – como diziam e nos ensinavam – dando voz e vez à periferia de São Paulo, então em pleno e desordenado desenvolvimento.

(Conto parcialmente a história de ambos na crônica “Marcão e Zé Jofre”, escrita em 2002 e aqui publicada em 8 de outubro de 2007. Consta também do livro “Meus Caros Amigos – Crônicas sobre jornalistas, boêmios e paixões”, lançado em 2010.)

Feita a apresentação, voltemos ao nosso assunto.

III.

Foi o que efetivamente começou a acontecer a partir dos anos 80 no embalo das transformações tecnológicas e mesmo social. Os jornais passaram a ser um produto de mercado (antes, por mais que fossem, não eram entendidos como tal) e o jornalismo passou a ser mais técnico do que propriamente autoral.

À época, Chico Buarque gravou a emblemática “A voz do dono e o dono da voz”, falando da relação das gravadoras com o artista. Na nossa “ilha” de resistência ao jornalismo (que alguns chamavam de) romântico, entendíamos que a analogia também poderia ser feita ao que se vivia nas grandes redações.

A reportagem perdia (e perde) espaço, e a crônica…

IV.

Embora ainda se encontre algum bravo defensor, o gênero foi atropelado pelo aburguesamento das redações e pela ditadura dos manuais de redação.

O cronista que andava de ônibus, vivia nos botecos e estava junto com as causas populares foi perdendo espaço para colunistas especializados – o psicólogo, o antropólogo, a ex-prefeita, o cientista política; e mais recentemente para a atriz global, o humorista da vez…

Nada contra, apenas uma constatação.

Tais senhores nos ensinam, como viver, o que é certo e o que é de bom tanto.

Não compartilham (a palavrinha da moda) o nosso modesto espaço, o chinfrim do nosso dia a dia de cidadãos comuns – e por isso mesmo bem mais próximo da realidade de um Brasil que se quer de todos os brasileiros.
Encerro a série de posts sobre crônicas e cronistas, iniciada na sexta neste modesto espaço, respondo a questões que me foram feitas sobre o tema:

01- Crônica: jornalismo ou literatura?

A crônica é um gênero jornalístico, embora flerte descaradamente com a literatura – ou vice-versa. Nasce nos primórdios da imprensa brasileira e se consagra entre os anos 40 e 70. Não tem a densidade ficcional do conto, mas não despreza a criatividade imaginativa do autor e a originalidade dos personagens e das situações narradas.

Tudo começa no início do século 20 com João do Rio e ganha formato com outro pioneiro, Humberto de Campos, autor de Notas de Um Diarista (Entenda-se aqui “diarista” como alguém que escrevia no jornal todos os santos dias).

02 – Os principais cronistas

A seguir faço uma listagem dos 20 nomes da minha preferência. Não há qualquer critério para a ordem de apresentação.

São eles:

Rubem Braga,

Nélson Rodrigues,

Sérgio Porto (Stanislaw Ponte Preta),

Drummond,

Rachel de Queiroz,

Fernando Sabino,

Joel Silveira,

Luis Martins (o LM),

Paulo Mendes Campos,

João Antônio (criador do conto/reportagem)

Marcos Rey,

Diaféria,

Raul Drewnick,

Antônio Maria,

Plínio Marcos,

Carlos Heitor Cony,

Mário Quintana,

Veríssimo

Inácio Loyola Brandão e

Manoel Carlos.

*(Vez ou outra, em sua coluna na Folha de S.Paulo, o médico Dráuzio Varela se revela um bom cronista quando troca o assunto de sua especialidade, a medicina, pela observação do cotidiano e suas gentes.)

3 – Considerações finais

Todo brasileiro bom de prosa é, por natureza, um cronista. A crônica é como aquela conversa que se compartilha, leve e solta, com amigos, na mesa do bar. Ou aquele contar de causos e relatos descompromissados como se ele (o cronista) e o leitor estivessem tomando uma fresca naquela varanda, entre uma golada e outra (a bebida fica à sua escolha), um petisco e outro, enquanto a vida, teor de todas as conversas, segue

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