Por SARAH MAIA, da revista Pais & Filhos
“Devemos ser a mudança que queremos ver no mundo”
Mahatma Gandhi.
“A nossa geração irá definir o futuro ambiental do mundo”
Marcelo Furtado, Greenpeace.
“Precisamos enfrentar o fato, meus amigos, de que o amanhã já é hoje. Estamos de frente para a feroz urgência do agora. E nesse dilema da vida e da história, existe o que se chama de chegar atrasado”.
Martin Luther King Jr.
O mundo deles
De quem é o mundo?
Você já parou para observar o mundo que está deixando para o seu filho? Ou a água que pode economizar para que não falte no futuro? Já pensou que, em alguns dias da semana, você pode deixar seu carro em casa e contribuir para a diminuição de gases poluentes na cidade em que mora?
Se você respondeu não a todas essas perguntas está na hora de pensar um pouquinho. Imagine que seu filho, ou mesmo seus netos, não terão acesso à água potável, que o nível de poluição será tão alto que doenças respiratórias serão corriqueiras, o mundo estará tão quente que eles precisarão conviver com enchentes, secas, falta de alimentos ou até mesmo furacões e outros desastres ecológicos.
Pode parecer que o rumo do nosso planeta não afeta diretamente a sua vida e a vida da sua família, mas não é difícil perceber que o problema está mais perto do que a gente imagina.
Fora da ordem
Nos últimos anos excedemos a capacidade do planeta de suportar nosso estilo de vida. Segundo o relatório Planeta Vivo 2006, lançado pela rede WWF (World Wildlife Fund), o homem hoje consome por ano 25% a mais de recursos naturais que a Terra é capaz de repor. Para ter uma idéia, serão necessários dois planetas em 2025 para manter os padrões de consumo atual.
“Nós temos tantos recursos que não valorizamos. Mas, com certeza farão muita falta amanhã. Tamanha poluição e destruição tornam o mundo inviável. A Terra se transformou em algo descartável. As pessoas produzem muito lixo e não se preocupam com o que acontecerá depois”, afirma Maluh Barciotte, mãe de Pedro e Bruna, biólogo e consultora do Instituto Akatu pelo consumo consciente.
Uma das principais conseqüência desse consumo desenfreado e da falta de compromisso com os recursos naturais é o aquecimento global, que afeta toda estrutura ecológica do planeta. Só no último século, a temperatura da Terra aumentou 0,7°C e as previsões não são das mais animadoras. Segundo especialistas, caso a temperatura aumente mais que 2°C, poderá provocar extinção em massa de muitas espécies, colapso dos ecossistemas, falta de alimentos e enormes prejuízos econômicos.
O grande responsável pela reviravolta climática atual é o homem. O aquecimento global é conseqüência direta da emissão exagerada de gases causadores do efeito estufa, como metano, óxido de nitrogênio e principalmente o dióxido de carbono (CO2), lançado na atmosfera através da queima de combustíveis fósseis (petróleo, gás natural e carvão) em casa, nas fábricas ou usinas, ou através do desmatamento. A concentração de CO2, que antes era da era pré-industrial não ultrapassava 300 pppm (partes por milhão) passou para 378 ppm em 2005. E não é preciso esperar muito para sentir os efeitos das mudanças climáticas no planeta.
O ano de 2005 foi o mais quente já registrado. Com isso, os oceanos esquentaram, as geleiras derreteram e as tempestades ficaram cada vez mais poderosas. Só no ano passado foram registrados 360 desastres naturais, 18% a mais que no ano anterior. E para quem não se lembra o Brasil também foi afetado. O furacão Catarina, em 2004, atingiu cidades costeiras do Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
Por aqui
O Brasil é o quarto maior emissor de gases do efeito estufa. Com o desmatamento e queimadas lançam mais de 200 milhões de toneladas de carbono na atmosfera. Só o desmatamento da Amazônia é responsável por 2% da mudança global. A queima de combustíveis fósseis, principalmente nas grandes cidades, corresponde a 22,5 % do CO2, jogando no ar índices absurdos de poluição. E os reflexos podem ser vistos em outros estados também. A agricultura gaúcha enfrentou entre 2004 e 2005 a estiagem mais intensa dos últimos 50 anos.
“O nosso maior vilão é com certeza o desmatamento da Amazônia. A água do centro-sul, por exemplo, vem da Amazônia e isso irá provocar um efeito direto na vida das pessoas. Imagine que se todo carbono armazenado na floresta amazônica fosse para a atmosfera, haveria um aumento de 15% a 17% na concentração de gases do efeito estufa em todo mundo”, explica Marcelo Furtado, pai de Martim e Luiza, diretor de campanha do Greenpeace. E olha que a floresta já perdeu 70 mil km² de seu território só entre 2004 e 2005.
E agora?
O que fazer com tanta poluição, desmatamento, descuido e irresponsabilidade com o meio ambiente? Agir. Não tem outro jeito. A situação ainda pode ser revertida, mas é preciso começar agora, para que as gerações futuras não sofram as conseqüências de tanto descaso. Algumas atitudes, como exploração de energia eólica, solar, práticas agrícolas sustentáveis, construção de hidrelétricas e uso de biogás como geração de energia, não dependem de nós. Nem a estipulação de políticas mais rigorosas para controle de gases poluentes.
Mas é claro que dá para cada um, em casa, no trabalho, na escola das crianças ou mesmo no seu bairro, ter pequenas atitudes mais conscientes e responsáveis. Só o fato de deixar o carro na garagem duas vezes por semana reduz em até 320 quilos de CO2 por ano.
E não precisa mudar completamente sua rotina para contribuir o mínimo possível para preservação ambiental. “Todos querem qualidade de vida, mas as escolhas devem ser acima de tudo, sustentáveis”, diz Maluh Barciotte.
Cláudia Degossi não transformou radicalmente seu estilo de vida, e nem sacrificou as vontades da família para se manter em dia com a natureza. Implantou coleta seletiva no prédio e com ajuda do filho, Gianluca, passou a controlar o uso de gás, luz e água dentro de casa. Cláudia não compra embalagens descartáveis, e o menino já sabe que para desenhar e pintar em casa só se for com papel reciclado.
Efeito Multiplicador
Além dos exemplos que tem em casa, Gianluca tem a sorte de estudar em uma escola que se preocupa com a manutenção do meio ambiente. Aluno da escola Stance Dual, o menino, assim como as outras crianças, tem sua caneca para tomar água (não usa copo de plástico) e usam toalhas de pano para enxugar as mãos, mudanças propostas pelos próprios alunos “ Implantamos na Stance Dual a Agenda 21 (conjunto de metas para desenvolvimento sustentável) desde 2000 e trabalhamos para que as crianças sejam multiplicadores de ações conscientes”, explica Débora Clonezi, mãe de Paola e coordenadora do projeto.
Outra escola de São Paulo que também segue o mesmo caminho é a Escola Viva, que faz questão de deixar os alunos em contato com a natureza. Lá, as crianças participam do plantio na horta, e em um grande quintal de terra batida aprendem ao mesmo tempo a respeitar o espaço comum e a preservar cada flor e animal do lugar.
“A prática é altamente educativa e os princípios básicos devem ser sempre os mesmos: respeitar tudo aquilo que é vivo e exercer a cidadania”, garante Sônia Marina Muhringer, mãe de Michelle, Janaína e Tainá, e coordenadora da área de meio ambiente da Escola Viva.
Sônia conta que muitos alunos levam para dentro de casa o que aprenderam na escola e que pegam no pé dos pais para economizar energia e evitar desperdício. “A consciência deve começar desde pequeno e ser contínua. Se os pais não têm essa postura responsável, as crianças precisam lidar com essa incoerência dentro de casa”.
Educação dentro de casa
“O aprendizado crítico deve ser vivido através da ação. As crianças precisam se identificar com a natureza e perceber que elas também fazem parte do meio em que vivem. Os pais devem buscar formas de interagir e fazer com que o filho perceba a importância de preservação ambiental” afirma Vânia Dohme, mãe de Vanessa e Samanta, autora do livro Ensinando a Criança a Amar a Natureza.
Não adianta seu filho aprender na escola, nos livros ou até mesmo com a televisão que é importante reciclar, economizar luz e água e não jogar papel na rua se ele não vê atitudes como essas dentro de casa. E também não vale em nada cobrar atitudes coerentes das crianças se você demora no banho ou se não pensa duas vezes antes de comprar embalagens descartáveis.
“Retiramos muitos mais do que o planeta sustenta, e em troca devolvemos cada vez mais lixo. De tudo que é produzido no Brasil, 40 % é consumido, o resto é desperdiçado”, garante Maluh Barciotte. Para ela, membro do Instituto Akatu, os pais precisam vetar a descartabilidade dos produtos e o consumo desenfreado, e mostrar às crianças que tudo que se tira da natureza tem um preço. “Desde a comida que colocamos a mesa até o lixo que é reciclado devemos pensar em como manter o meio ambiente para os nossos filhos”, afirma Maluh.
É preciso realmente se conscientizar de que depende de cada um preservar ou não o mundo das futuras gerações. Alguns efeitos são sentidos agora, mas as grandes conseqüências de tanta destruição pesarão mesmo na vida, no bolso e na saúde das nossas crianças.
II. O QUE VOCÊ PODE FAZER
– Comprar produtos duráveis: compre menos e escolha itens com maior tempo de duração, ou que sejam classificados como nível A em eficiência energética. Tente consertar antes de jogar seu eletrodoméstico fora ou doe para quem precisa.
– Trocar lâmpadas incandescentes por fluorescentes: apesar de serem mais caras, lâmpadas fluorescentes duram 10 vezes mais e gastam até 66% menos energia.
– Deixar o carro na garagem: quando possível ande a pé, use transporte coletivo ou ande de bicicleta. Faça rodízio com os pais de amigos do seu filho para ir e voltar da escola. Dê preferência para combustíveis como álcool e biodiesel e faça revisões periódicas no seu carro para reduzir a emissão de poluentes.
– Usar energia solar: se você mora em casa, procure instalar energia solar para aquecimento e iluminação.
– Comprar móveis de madeira certificada: compre apenas madeiras de reflorestamento.
– Comprar embalagens recicláveis: evite embalagens descartáveis e compre produtos de empresas que se preocupem com a manutenção do meio ambiente. Leve as compras de feira e de supermercado em sacolas reutilizáveis.
– Implantar a coleta seletiva de lixo em casa e no seu ambiente de trabalho.
– Cobrar: exija sistemas eficientes de drenagem urbana, coleta e tratamento de esgoto na sua cidade.
III. O QUE Pais e Filhos PODEM FAZER JUNTOS
– Economizar energia: apague as luzes desnecessárias e desligue aparelhos domésticos que não estiverem em uso,
– Não desperdiçar água: feche a torneira enquanto escova os dentes, não demore no banho e não esqueça a torneira aberta. Aproveite a água da máquina de lavar, por exemplo, para limpar o chão.
– Plantar árvores: no quintal, na praça, em frente ao prédio, no sítio ou na escola.
– Evitar desperdício: evite desperdício de alimento, brinquedos, roupas, utensílios domésticos, papel, etc.
– Comer carne uma vez por semana: o controle no consumo de carne ajuda a conter o desmatamento provocado pela pecuária, atividade que emite muito CO2.
– Reciclar o lixo: faça coleta seletiva de lixo em casa
– Não jogar lixo nas ruas: mantenha sempre um saquinho de lixo por perto para não poluir ainda mais as ruas da sua cidade.
– Incentivar os outros a também ter uma postura mais consciente.
O QUE eles ESTÃO FAZENDO
Algumas empresas já tomaram medidas para combater a degradação ambiental. Veja algumas atitudes que fazem a diferença:
– Faber Castell: planta árvores para produção dos lápis, mantém desde 1989 projetos amplos de reflorestamento no Brasil. Entre eles: Programa Animal, para preservação da fauna, Programa Arboris, voltado para flora brasileira, Programa ECOmunidade de educação ambiental, Monitoramento da Qualidade da Água e Programa de Conservação dos Solos.
– Boticário: lançou em 2006 o projeto Oásis, que criará um sistema de pagamento por serviços ambientais aos proprietários de terra que se comprometerem a conservar áreas de Mata Atlântica na Grande São Paulo.
– Amigos da Natureza: a marca infantil investe em jeans feitos com algodão reciclável, embalagens de plástico oxibiodegradável, uso de algodão colorido naturalmente, não usa metais pesados na estamparia, e o amaciamento das peças é feito com cupuaçu de plantio sustentável.
– Nestlé: adequou a produção para economia de água, energia e redução de poluentes, investe em reciclagem dos resíduos gerados e mantém parcerias com Ongs e institutos ambientais.
– Natura: foi pioneira no uso de embalagens refil e os ingredientes usados são extraídos da natureza de forma sustentável.
O QUE PODERÁ ACONTECER
Como será o futuro da Terra se cada um não fizer a sua parte?
Imagine daqui…
20 anos: mais de três bilhões de pessoas viverá em países sujeitos a pressão por falta de recursos hídricos. Cerca de 14 países passarão para escassez efetiva de água. A ONU prevê que em 2025 duas em cada três pessoas do planeta não terão água potável.
45 anos: O nível de CO2 (dióxido de carbono) chegará a 600 ppm (partes por milhão).
50 a 80 anos: as geleiras que já derreteram irão aumentar o nível do mar entre 30 e 80 cm e o gelo do Ártico poderá derreter totalmente até 2080. Extremos de temperatura se intensificarão tanto no verão quanto no inverno. As chuvas serão mais freqüentes. As regiões metropolitanas ficarão mais quentes, com mais inundações, enchentes e desmoronamentos. Mais de 200 milhões de pessoas deverão ser deslocadas pela elevação do nível do mar, 40% das espécies serão levadas à extinção. Até a metade deste século não restará peixes no mar. A taxa de subnutrição será elevada em 15% a 26% em todo mundo, aumentando de 75 milhões a 125 milhões o número de pessoas subnutridas.
80 a 100 anos: parte dos seis milhões de km² de floresta Amazônica se transformará em cerrado, o semi-árido ficará ainda mais seco e a caatinga será substituída por vegetação seca, típica de deserto. O aquecimento global irá aumentar as temperaturas na Amazônia entre 2°C e 3°C e poderá haver redução de chuva entre 10% a 20%. A produção agrícola se tornará inviável. Além disso, o alto potencial de evaporação causará a diminuição da água de lagos, açudes e reservatórios. Formação de desastres naturais cada vez mais intensos, inclusive na costa brasileira. Algumas doenças, como malária e febre amarela se expandirão para outros territórios. Queda na produção de grãos e conseqüente redução da segurança alimentar, principalmente em países mais pobres.
100 anos: a temperatura da Terra subirá entre 1,4° C e 5,8° C.
200 anos: a Terra ficará de 7°C a 10°C mais quente.
Para saber mais
ANTES QUE A TERRA FUJA de Julieta de Godoy Ladeira
AZUL E LINDO: PLANETA TERRA, NOSSA CASA de Ruth Rocha e Otavio Roth
CIDADANIA É QUANDO… de Nilson José Machado
CONVIVENDO COM A ECOLOGIA- Unicef
ENSINANDO AS CRIANÇAS A AMAR A NATUREZA de Vania Dohme e Walter Dhome
GUIA ECO KIDS-ANIMAIS BRASILEIROS AMEAÇADOS EM EXTINÇÃO de Marli Mitsunaga
MEU RIO de Shari Halpern
SE O MEU MUNDO FOSSE UMA VILA de David J. Smtih
SEIS RAZÕES PARA CUIDAR BEM DA ÁGUA de Nilson José Machado e Silmara Rascalha Casadei
PACHAMAMA-MISSÃO TERRA 2, projeto conjunto do Programa para o Meio Ambiente da ONU e do Peace Child International.
PARA QUEM É O MUNDO? de Tom Pow
UMA VERDADE INCOVENIENTE de Al Gore.
Editora Manole
UM DIA NA AMAZÔNIA de Gilson Barreto
Consultoria:
Maluh Barciotte, bióloga, doutora em Saúde Ambiental e consultora do Instituto Akatu pelo consumo consciente.
Tel. (11) 3141-0177.
www.akatu.org.br
Marcelo Furtado, engenheiro químico, ambientalista e diretor de campanha do Greenpeace.
Tel. (11) 3035-1167
www.greenpeace.org.br
Débora Clonezi, coordenadora do projeto Agenda 21 da escola Stance Dual.
Tel. (11) 3255- 2780
Ana Maria Nolasco, diretora de estilo da marca Amigos da Natureza.
Tel. (31) 2112-0200
Sônia Marina Muhringer, coordenadora da área de Meio Ambiente da Escola Viva. Tel. (11) 3040-2250
Elaine Machado, Gerente de Serviços para Marketing Faber Castell
Tel. 0800-701-7068
Vânia Dohme, mestre em educação e autora do livro Ensinando a Criança a Amar a Natureza.