Nas aulas de História do Jornalismo Brasileiro, não resisto a provocação perguntar aos estudantes: haveria espaço hoje para o jornal Notícias Populares, que era assumidamente sensacionalista e voltado para as classes C e D? As respostas são sempre difusas – mas, na maioria, os futuros jornalistas dizem não.
Antes de propor o debate, exibo um documentário sobre o Notícias Populares que, nos anos 60, criou o discutido “jornalismo fantástico”. O jornal ganhou notoriedade e fama por reportagens inverossímeis como o “bebê-diabo” e o “chupa-cabra”. Mas, os velhos jornalistas, comandados pelo romeno Jean Mellé e depois por Ebrahim Ramadan cuidavam para não colocar fontes e entrevistados a execração pública. Ramadan, inclusive, usava de um recurso bastante engenhoso para ‘manchetar’. Fazia três ou quatro títulos e fazia uma votação junto aos contínuos do jornal. O que vencesse ilustraria a primeira página no dia seguinte, e em letras garrafais.
Era um modo de estar em sintonia com os leitores, falar a língua deles, respeitá-los – mas, não eram eles que determinavam o assunto a merecer destaque.
No início dos anos 90, o NP passou por uma reformulação para enquadrá-lo aos novos tempos e tentar dar um equilíbrio ao furor sensacionalista. Uma nova geração de profissionais de Imprensa assumiu o comando. Durou pouco a fase de comedimento. Empolgada pelas boas tiragens, logo a rapaziada estava fazendo pior. Lembro que num dado momento do documentário, a editora do NP, Laura Capriglione, faz um méa-culpa e diz mais ou menos o seguinte:
— Quando recebíamos os boletins de tiragem, era uma festa na redação. Subíamos nas mesas para comemorar. Aí, na edição seguinte, aumentávamos um tom acima na manchete. Carregávamos mesmo. Partimos com tudo para o bizarro e para o sexo. Às vezes, o jornal era só sexo mesmo…
Ou seja, o respeito pelo bom jornalismo – e conseqüentemente pelo leitor – foi para as cucuias…
Na noite de domingo, o Fantástico bateu o recorde de audiência – algo em torno de 33 pontos de média no Ibope e picos de 43 pontos nos 24 minutos que durou a entrevista, com Ana Carolina Oliveira, a mãe da menina Isabella. É gente pra dedéu. Dizem que cada ponto equivale a 55, 5 mil domicílios, só na Grande São Paulo onde se realizou o levantamento…
Imaginei os jornalistas do Fantástico em cima das mesas a comemorar os bons índices de audiência. Estão reféns da opinião pública, longe, muito longe do bom jornalismo que apregoavam meus velhos camaradas.
— A imprensa, filho, é a expressão do pensamento social. Mas, nunca o jornalista pode ficar refém da opinião pública.