Por certo, esta não é uma boa notícia a que trago para os meus amáveis cinco ou seis leitores (se é que ainda andam por aí?).
Seguinte.
Passei ontem pela Vila Capocha, região do Grande Ipiranga, e reparei na placa de “Vende-se” diante do sobradinho esperto onde, até meados de 2016, o amigo Escova e sua trupe se abrigaram das intempéries do tempo e da vida.
Explico o porquê do desalento dos meus preclaros seguidores. Não é de hoje que a turminha me cobra o paradeiro (e as divertidas histórias no Blog) do Escova, o mais ativo Dom Juan das Quebradas do Sacomã naqueles idos de 70, 80 e quequérecos.
(…)
Respondo como posso.
Ele se mandou do País logo depois que impicharam a Dona Dilma, desiludido com os rumos que a coisa toda tomava. O malandro tinha lá suas parcas economias e disse que, na idade em que estava, não merecia ver o Brasil andar para trás.
– É a barbárie, meu caro, é a barbárie que se aproxima.
(…)
Sacramentou a frase e partiu para um “mochilão” na Europa na virada dos 70.
Levou a Sra. Escova a tira colo.
A última notícia que tive é que estava no interior da França, tirando uma de avô. Mas, andava ainda mais triste com as notícias que lhe chegavam sobre o País.
Tentei comovê-lo com uma Carta ao Amigo Escova Sobre a Greve Geral.
Foi vã minha tentativa.
(…)
De certa forma, e às vésperas da implantação desta retrógada Reforma Trabalhista, não é exagero dizer que, melhor do que muitos dos cientistas políticos que andam pelaí, Escova preconizou os passos em falsos rumo ao abismo que, hoje, lamentavelmente parece nos aguardar.
Falou que iriam acabar com os direitos do trabalhador brasileiro, do calvário dos aposentados, do retrocesso em termos de direitos humanos, do avanço dos grupos conservadores de má índole, da falência do Estado, da entrega do Pré-Sal para os inimigos da Pátria e outras tristezas que andam soltas no noticiário e em nosso cotidiano.
Falou e disse.
(…)
Eu e o Escova somos amigos de longa data.
A gente se conheceu na velha redação de piso assoalhado e grandes janelões para a rua Bom Pastor nos idos em que ali cheguei.
O solerte repórter Escova já andava por lá.
Somos dos raros remanescentes da turma do Marcão, do Zé Jofre, do AC, do Nasci, do Made e tantos outros. Todos os que citei já se foram. Os demais tomaram destino incerto e não sabido.
Ficamos avulsos.
Renitentes a ação do tempo, porém, insistimos – eu, o Escova e agregamos o amigo Poeta – com a tradição do grupo de se reunir todo o sábado pela manhã nos botecos do Sacomã.
Era uma reverência aos “old times” e uma estranha forma de nostalgia, mas – confesso – nos fazia um bem danado.
Mas, aí, o Escova se foi…
(…)
Vou lhe dizer, com sinceridade: eu cultivava um fio de esperança de reencontrar em breve o amigo, numa dessas quebradas do mundaréu.
Toda vez que embicava o carro na direção do Ipiranga e passava pelo antigo Ponto Fábrica, dizia baixinho para mim mesmo:
“Ele vai voltar. Um dia, ele volta… ”
Hoje, pensando bem, do jeito que o Brasil está… E, depois da placa que ontem vi, o cara vai virar cidadão francês.
Sai o sacudido Dom Juan das Quebradas do Sacomã, entra em cena o grand-père Monsieur Escovà…
Luiz Gomes
10, novembro, 2017São 7 leitores! 🙂