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Título: O pai e a São Silvestre
Autor: Rodolfo C. Martino - publicado em 03/11/2011
 

O pai tinha um jeitão muito na dele.

Preferia ouvir a falar, sempre com um sorriso contido que tanto poderia ser de interesse como de discreta ironia ao que o interlocutor dizia.

Lembrar sua trajetória de esportista era um dos raros assuntos que fazia o Velho Aldo se empolgar e soltar o verbo.

Até os 17 anos, ele tentou ser goleiro. Mas, a baixa estatura (pouco mais de 1,65) o fez desistir da empreitada. Tornou-se então um raçudo centro-avante do Atlantic e do 1º de Maio, dois baluartes da várzea paulistana, ainda quando o futebol se consolidava como o esporte preferido dos brasileiros.

Mais tarde, foi campeão de ping-pong do extinto Olímpicos Esporte Clube, com sede social na rua onde morávamos, a Muniz de Souza.

O pai ganhou medalha e tudo.

(Eu era garoto – e fiquei orgulhoso do Velho.)

No entanto, a maior aventura do pai, segundo as próprias palavras, foi correr a São Silvestre lá pelos idos da década de 40.

Todo pimpão, ele dizia que concluiu o percurso com folga, chegando em ducentésimo primeiro lugar.

Nunca soubemos ao certo quantos atletas participaram da competição.

O pai garantia que eram muitos, centenas e centenas. Milhares, talvez.

E dá-lhe sorriso no canto da boca a desafiar nossa compreensão.

Naquele tempo, a corrida começava por volta das 23 horas do último dia do ano – e percorria as ruas do que hoje chamamos de Centro Velho.

Não raras vezes os atletas ainda estavam na pista quando espocavam os fogos da virada de ano.

Era uma grande festa, uma celebração, dizia o pai com olhos de encantar e riso aberto.

O pai não gostou nada quando, em 1989, soube que o horário da prova seria alterado. Inclusive com mudança do itinerário. Aconteceria à tarde por questões estratégicas de transmissão pela TV etc etc.

-- Não será mais a mesma São Silvestre. Vai perder o brilho, o charme...

Ouço agora que, pela enésima vez, o trajeto da prova será modificado para que a corrida termine junto ao Obelisco do Ibirapuera (Assim não atrapalha a organização dos shows de réveillon que a Globo promove na avenida Paulista).

Desse jeito, sou obrigado a concordar com o Velho Aldo que tanto falta me faz, e que àquela época fez a seguinte profecia:

-- Do jeito que as coisas vão, qualquer dia trocam até o santo que dá nome à prova. Só para dar mais audiência.

 
 
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