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Título: No automático
Autor: Rodolfo C. Martino - publicado em 14/03/2015
 

- Duas marmitex, por favor.

Manhã de sábado, dia da preguiça, e Derico entra no restaurante do bairro, na ‘pilha’. Faz o pedido, sem sequer dar bom-dia a ninguém.

Na mesma (e ausente) vibração, recebe a resposta da balconista:

- Carne, frango ou mista?

A morena taluda, de cabelo preso, sequer levanta os olhos na sua direção. Preenche o pedido, encaminha à cozinha e, ainda indiferente a ele, cumpre o ritual que lhe cabe:

- O refrigerante está na promoção. Vai levar?

Derico fica tentado a dizer sim. Quando dá por si, já anunciara o não. Só então justifica para si mesmo com a orientação médica de evitar “esse veneno” para controle da pressão.

Enquanto aguarda a encomenda frugal, se põe a imaginar o quanto sua vida – e a de muito gente – segue “no automático”, com perguntas e respostas previsíveis, mecanizadas. O quanto do comportamento das pessoas anda “no automático”.

A rotina é um tédio, pensa já impaciente com a demora. Ato falho: batuca no balcão um ritmo qualquer, com a ponta dos dedos.

- Tá com pressa, doutor?

No automático, olha o desconhecido atrás dele, em fila – como adoram os paulistanos. Dá para perceber que também ele está louco para ser atendido.

- É fome mesmo, diz sem pensar.

Os dois riem, e dão por encerrado o assunto.

Derico se deixa levar por pensamentos, desodernados, imprecisos.

“Que vida é essa que estamos vivendo? Será que algum dia eu vou lembrar dessa manhã em que comprei dois marmitex, conversei com um desconhecido, não cumprimentei ninguém e fui atendido por uma balconista que sequer levantou os olhos para me ver?”

Deixou no ar as indagações.

Ainda sem lhe olhar a moça lhe entregara o pacote com o rango do dia.

Caminhou para o carro demonstrando pressa.

Irina, a esposa, o esperava para o almoço.

“Pressa, por quê? Hoje é sábado. Não temos qualquer compromisso”.

Só então se deu conta de quanto tempo não dava bom-dia à Irina, não lhe perguntava como foi o seu dia, não lhe fazia um carinho, não lhe dava um beijo...

Achou-se o último dos homens.

Prometeu mudar. Mas sem demonstrar grande convicção:

"Uma quentinha quentinha, depois uma soneca; no sábado à tarde é o que há.

 
 
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