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Título: A manauara
Autor: Rodolfo C. Martino - publicado em 13/11/2015
 

Sabíamos apenas que tinha um nome pomposo, Deovaldo – mas, nós só o chamávamos de Déo. Nós que eu digo é a fina flor dos desvalidos que frequentava aquele boteco que desapareceu no tempo, esquina das ruas Bom Pastor com Greenfeld, onde hoje está a igualmente pomposa Estacão Sacomã do Metrô.

Déo era moço simples que mais ouvia as nossas histórias do que propriamente bebia e/ou contava suas prosas. Nasci, Almir, Manoelino, Escova, Made, Cebola e outros tantos e tamanhos, com suas artes e manhas, eram os verdadeiros super-heróis do lugar. Imbatíveis em seus causos e contos.

Bebedeiras, conquistas amorosas, discussões clubísticas, momento político do País (vivíamos os idos da redemocratização), maledicências generalizadas e histórias da boemia de uma São Paulo que não mais existia eram os temas de praxe – sempre regados à cerveja e cachaça que era pra aquecer as gargantas e as peripécias.

Só uma vez, que eu me lembre, Déo se pôs a nos contar uma quase conquista.

Sabíamos da sua paixão por uma (in)certa morena que, quase todos os dias, ele encontrava no ponto de ônibus logo pela manhã. Mesmo com seus olhares insistentes, elazinha não lhe dava mole e fazia questão de deixar bem à mostra o anel de compromisso em um dos dedos da mão direita.

Vez ou outra, alguém provocava o rapaz, com a célebre pergunta, natural em um ambiente amplamente machista como aquele:

- E aí já passou o rodo na manauara do ônibus?

Explico o “manauara”.

Pela descrição que o Déo fizera dela – taludinha, cabelos negros corridos, olhos grandes e de um instigante tom de castanho, boca grande e largo sorriso -, o Cebola, que havia retornado de uma viagem ao Norte do País, garantia que, pelas feições, era “uma autêntica cidadã de Manaus”.

Déo não sabia lhe responder sobre a origem da moça. Ela não dava a mínima. Havia ocasiões em que seus olhares se cruzavam – e ele próprio sentia-se invadindo a privacidade dela.

No ato, baixava o olhar, constrangido.

Até que, naquele sábado, Déo chegou alegrinho, digamos assim. Disse que, no dia anterior, encontrou a amada logo cedo no ponto de ônibus. E ela estava diferente. Continuava de aliança no dedo, mas era só sorrisos pro lado dele. Chegou mesmo a ‘puxar’ assunto. Perguntou se o “Ipiranga-Sumaré” passava pela Doutor Arnaldo – ora se ela pegava o coletivo todos os dias, já deveria saber que sim.

E aí, cara, foi pra cima dela? – perguntamos quase que em coro. Torcíamos pelo sim.

Mas, a resposta foi:

- NÃO, estão loucos! Claro que não. Sabem que dia era ontem?

- Não tem hora, não tem dia, para essas coisas acontecerem, cara. Vacilou...

À observação abalizada do expert Escova, Déo foi contundente na resposta:

- Ontem era sexta, dia 13, cara. Dá um azar danado começar algo nesse dia...

 
 
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