O Sales me contou essa história – e eu só acreditei porque o cara é meu amigo de fé, irmão, camarada. Também porque tem certas coisas que só acontecem com ele e com o Palmeiras de tão esquisitas que são.
Por outra, o Sales não teria motivo para inventar uma presepada dessas. Até porque, ao que me consta, ele foi apenas coadjuvante e testemunha ocular do ocorrido.
Deu-se o seguinte.
Ele e mais três amigos de longa data resolveram se encontrar noite dessas em um boteco da Vila Madalena, pouca coisa distante dos grotões do Jabaquara onde residem em casas mais ou menos próximas os fanfarrões.
Por que os chamei de fanfarrões – pergunta-me o amável leitor.
Ora, pois vejam o que se deu e depois me digam se tenho ou não razão.
Os três são casados – e resolveram aproveitar o alvará de soltura. Encheram o latão a tal ponto que, até por força dos novos rigores da lei seca, não conseguiram sequer localizar seus automóveis, estacionados sei lá por quem nas quebradas maliluminadas que circundam a região dos barzinhos.
Só com muito custo, depois de localizarem os veículos, o Sales (que preferiu manter-se à míngua de álcool durante toda a noite, já prevendo confusão) os convenceu a deixarem os automóveis em estacionamento aparentemente seguro e ele próprio (Sales) se comprometeu a levá-los para as respectivas casas.
Eles toparam, com a ressalva de tomarem a saideira num bar que insistia em permanecer aberto mesmo ao raiar da manhã.
Feito o trato, só hora e meia depois, a turma rumou para o Jabaquara.
Assim que chegaram ao primeiro endereço, começou o primeiro ‘barraco’. A porta do sobradinho se abriu e lá veio a Dona Encrenca, soltando fogo pelas narinas.
Era a esposa de um deles:
— Que papelão! Isso é hora de chegar? Dia claro, e bêbado feito um gambá. Que belo exemplo para as crianças…
O sermão da senhora corria solto – e não havia previsão para terminar.
— Sabe quando você vai sair para encontrar esses vagabundos de novo? Sabe quando?
Ninguém ousava sequer sair do automóvel para enfrentar a fera.
Até que um deles encheu-se de coragem – e foi à luta:
— Peralá, a senhora não pode sair por aí generalizando tudo. Não, não, isso é injusto. Até porque o amigo Sales não bebeu sequer uma gota de álcool para nos prestar esse serviço dentro da lei e dos limites de segurança. Ademais, veja qual dos três é o seu marido, recolhe logo que as esposas dos outros dois devem estar tão aflita quanto a senhora…
