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Cantoria

Ame, seja como for
Sem medo de sofrer
Pintou desilusão
Não tenha medo nãq
O tempo poderá lhe dizer…

(…)

Acordo cantarolando o samba “Ame” de Paulinho da Viola.

Nem debaixo do chuveiro, nessa manhã fria, os versos me largam

Que tudo
Traz alguma dor
E o bem de revelar
Que a tal felicidade
Sempre tão fugaz
A gente tem que conquistar

(…)

Não entendo o motivo.

Não me perguntem.

II.

Aliás, este é um mistério que sempre quis desvendar.

Acontece comigo – e também vejo que se dá com amigos e conhecidos.

Vez ou outra, sem motivo aparente, sacamos a letra e os acordes de uma velha canção lá dos confins da alma e do coração.

Será que essa cantoria tenta nos dizer algo?

III.

– Você ouviu a música no rádio, me diz o amigo Ferreira, com quem trabalho.

– Não ouvi, respondo e, em seguida, observo que ele mesmo, fã incondicional de Elvis, cai na mesma armadilha do imponderável. Não é raro ouvi-lo saborear um “It’s Now or Never” daqui, um “Tutti Frutti” dali. Quando emplaca um “Bridge Over Troubled Water”, sei que as coisas não estão lá aquelas coisas pro lado do amigo.

Ferreirão ri da minha consideração.

– Faz sentido, cara, faz sentido.

IV.

Dia desses, outro parceiro de trabalho, o Fernando, chegou a entoar o mestre Moacir Franco, lá dos primórdios da carreira deste mineiro de Ituiutaba:

Que será de ti
Quando a ilusão
Do seu coração
For chegando ao fim…

(…)

Que que é isso, minha gente!

Nem ele acreditou quando chamei atenção do nosso tenor de churrascaria.

– Ai, Jesus, de onde tirei essa lembrança?

Foi minha vez de ‘viajar’ – e mostrar minha pseuda erudição em termos de MPB.

“Vou lhe ajudar: trata-se de uma versão, feita por ninguém menos que o apresentador Hélio Ansaldo, famoso nos tempos da TV Record. Isso lá no início dos anos 60”.

V.

Lembrei a história com satisfação – e todos fizeram um respeitoso silêncio à minha memória.

Nem todos. Em tom de deboche, alguém murmurou que sou tão antigo que merecia uma ‘capa dura’ e um espaço na biblioteca. Também se mostraram encafifados com essas incontroláveis manifestações:

– Significaria exatamente o quê?

Neste exato instante, entrou em nossa sala aquela senhorinha, de ilibada reputação e óculos de grossos aros. Toda brejeira, no saltinho, deu bom dia aos presentes, ligou o computador e se pôs cantarolar Anita, o “Show das Poderosas”.

Prepara
Que agora
É a hora
Do show das poderosas

(…)

VI.

Só faltou alguém gritar:

– Que fase! A noite foi boa, hein, comadre…

Ninguém fez o deselegante comentário. Mas, pelos olhares trocados entre nós, podem acreditar que pensar, todos pensaram…