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Escrever e Esperançar

Foto: Jô Rabelo

Deixa eu lhe falar, companheiro.

Que por aqui, o Blog, se fez casa de amigos.

Há 16 anos é assim.

O tempo não para no porto

Não apita na curva

Não espera ninguém

Ah, os dolentes versos da canção O Tempo, do mineiro Reginaldo Lessa, vêm à mente sempre que me dou conta do passo e do caminho.

Longo e sinuoso caminho.

São inacreditáveis 4.400 posts – e eu ainda a insistir nesse mal-ajambrado enfileirar de letrinhas, uma a após outra, após a outra…

A troco de quê? – me pergunta espantado o moço que me serve o cafezinho, dos coados, no balcão da padaria.

É sina – respondi sem qualquer convicção.

“Escrevo porque escrevo”.

Um amigo de longa data, o Roberto, frequentador da padaria, deve ter espalhado para a rapaziada que ali trabalha que eu sou jornalista, “escreve livros e tudo”.

Daí a pergunta do moço, imagino.

Pergunta, aliás, que me faço até agora.

E não me dou a resposta definitiva.

Desconfio que nunca a terei.

No mais, me resta continuar tentando…

….

Sei, no entanto, o que provoca o questionamento..

Há um zunzunzum entre fregueses e funcionários do pacato estabelecimento neste fim de tarde.

Motivo, óbvio: as eleições de domingo.

Quem vai ganhar?

Na praça em frente ao prédio onde moro – e vizinha à padoca – uma turma de marmanjos espalhou vários pedestais, tipo bandeiras ao vento, com as imagens do Estropício, candidato à reeleição presidencial, e seu preposto que concorre ao governo do Estado que mal-e-mal conhece.

Foi pela manhã que a turma embandeirou o lugar – e ainda agora provocam conversas entrecortadas, em voz baixa, “para não dar confusão”.

– Que os ânimos andam exaltados.

Dá a impressão de que só tem bolsonimions por aqui.

Por conta e risco, eu e o rapaz do balcão somos cúmplices no “L” que discretamente fazemos com os dedos da mão.

…..

– Escreva, doutor, escreva, diz ele com jeito amigo.

Não sou doutor de coisa alguma, mas eis aí o toque e o mote para o post de hoje.

Lembro que, logo nos primeiros tempos da pandemia, talvez com saudade dos fins de tarde na padaria, fiz um breve post sobre o tema:

Escrever é sempre um ato solitário.

Mesmo quando há alguém do outro lado da tela ou próximo de nós, disposto a ler o nosso recado.

Escrever, de qualquer modo, sempre mexe com o Sr. Imponderável de Almeida que Nélson Rodrigues consagrou e, não raras vezes, revela situações outras, latentes a cada ser, sobre as quais os escritores, poetas e congêneres não têm o menor controle.

Escrever por escrever para se fazer terno, fraterno – e eterno, quem sabe?

Essa aventura, que vale a minha história de vida, passou a ser diária quando comecei no jornalismo em março de 1974.

E lá se vão quase 50 anos de trôpega jornada.

Jornada que (feliz ou infelizmente) me tornou um homem cético, mais para o realista.

Nunca, porém, me fiz distante dos ideais democráticos e cidadãos.

Sou – ou penso ser – por princípios um humanista.

Desconfio ser inerente aos da minha geração, os tais e os quais que amavam os Beatles e os Rolling Stones.

A geração sanduíche, prensada entre o pós-guerra e a luta pela redemocratização do país, com a sórdida ditadura militar de permeio.

A propósito, e em função do momento, vale registrar a melhor definição para o Brasil que ouso sonhar na antevéspera de mais um pleito eleitoral.

A idílica definição, eu a ouvi do dramaturgo Gianfrancesco Guarnieri, nos idos dos anos 80, em plena luta pelas almejadas Diretas Já.

Guarnieri era secretário da Cultura do então prefeito de São Paulo, Mario Covas – e, num jantar entre amigos em um restaurante próximo ao Museu do Ipiranga, ele sacramentou a fala:

“Lutamos pela construção de um país solidário, onde se faça a justiça social e seja plena a democracia. Lutamos pela construção de Brasil de todos os brasileiros”.

É nesse pensar grande e amoroso que embalo uma réstia de esperança no Brasil e no Planeta.

Talvez por isso – e mesmo que ingenuamente – escrevo.

E escrevo o que escrevo – e não tenho qualquer ilusão de mudar a opinião de alguém.

Escrevo o que escrevo para demarcar o meu humilde lugar no mundo.

Até quando?

Não sei.

Tantos e tantos anos depois – e cá estou a falar em defesa da democracia, de um país mais justo, igualitário, fraterno e contemporâneo.

– A troco de quê?

Ufa!

Resisto e insisto.

Escrever e esperançar é o que me cabe nesse latifúndio chamado Existência.

Esperançar, o lindo verbo que nos legou Paulo Freire.

Gente boa, não sei se escrevi tudo o que gostaria.

Mas, certamente, não escrevi uma palavra que não quis.

Voto Lula e Haddad – e tenho dito.

Vale o escrito!

Mais pra tardinha, mostro o texto para o moço do café.

Valeu – e sempre valerá.

1 Response
  • Clarice
    29, outubro, 2022

    Escreva amigo, escreva!!!

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