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Norminha, seo Abel e o amigo Escova

Permitam-me uma breve viagem no túnel do tempo…

Se ainda existisse aquele boteco que desapareceu nas obras do Metrô, ali na esquina da rua Bom Pastor com a Greenfeld, onde o bairro do Sacoman torce o rabo e o ônibus Fábrica-Pinheiro bufa, inclina e faz a curva, tenho certeza que o assunto hoje não seria outro.

A notícia de que Dona Norminha, a buliçosa personagem da novela das oito que começa depois das nove, está sendo cobiçada para enfeitar, como veio ao mundo, as páginas da revista Playboy.

Claro que a rapaziada aprovaria a escolha.

Aquela turba de desvalidos e chinfrins, que honrosamente frequentei naqueles velhos e bons tempos em que todos os telefones eram pretos e brancas eram as geladeiras, promoveria uma ampla discussão que contemplaria não apenas as formas suavemente roliças da insinuante morena. Mas, iria além. Por sermos todos, ali, versados e tergiversados no tema, invadiríamos, com a turva lucidez que a noite e alguns goles a mais nos presenteavam, os aspectos sociais e psíquicos da arte da sedução e, com perdão da má palavra, da infidelidade.

Parece que estou a ouvir o Shankar de todos nós, o grande Nasci, dizendo em alto e bom som:

— Há muito mais Guarda Abel entre o Céu e a Terra do que pode supor a nossa vã e ilusória percepção de marmanjo.

O borburinho percorreria as mesas de lata e o balcão de mármore – os contrastes eram o charme daquele “sujinho” de quinta – e as vozes obviamente se dividiriam em prós e contras.

Era quase um rito: os copos seriam esvaziados para uma nova rodada e as partes elevariam o tom do profícuo debate. Até que alguém, talvez o próprio Nasci, citasse o inefável Escova e uma de suas tantas venturosas aventuras românticas.

É que houve época em que Escova fez as vezes de Ricardão para uma Norminha daquelas toscas imediações. Um furdúncio. Encontravam-se no estacionamento do supermercado que até hoje existe nas imediações. Ali, a moça deixava o automóvel, dava um ‘migué’ que ia às compras e, na quebrada, entrava no Lada do amigo para ambos se deleitarem no drive-in mais próximo, na recém inaugurada avenida Tancredo Neves.

O marido da moça também era do pedaço e, para ser sincero, dos mais invocados.

Temíamos pela sorte do amigo, pois todo dia era dia pra o casal de adúlteros (mesmo que os encontros fossem sempre no fim da tarde quando ela dizia, em casa, ir buscar o jantar do maridão).

Não sei se houve cartas anônimas como na novela, sei que um belo dia Escova apareceu derrubadaço. Disse que não estava para conversa, gaguejou até que resolveu entregar.

O tal havia descoberto os pecadilhos da esposa – e agora queria se encontrar, cara a cara, com o Escova. O local seria uma nova lanchonete, na Tabor; do outro lado do bairro, onde o Sacoman ainda é chamado de Ipiranga.

Ele deveria ir sozinho. Era papo de homem para homem.
Uma última golada na cerveja do Nasci, Escova encheu-se de coragem e partiu para o enfrentamento.

Ficamos apreensivos.

Não demorou meia-hora e ele estava de volta. Lépido, faceiro e, digamos, pronto para outra.

Perguntamos:

— O que aconteceu?

— Nada demais, respondeu. – O cara é gente fina. Perdoou a moça. Disse que o que aconteceu entre nós foi importante para reafirmar o amor dois.

— E você?

— Eu? Nada. Jurei que não iria mais atrás da moça.

— Criou juízo, enfim…

— É. Nem mais, nem menos.

(* Querem saber. Aposto que o final de Norminha e o Guarda Abel não será diferente. É da vida e dos amores.) Foto: Jô Rabelo

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