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O homem e o rio

O mesmo homem não atravessa
duas vezes o mesmo o rio…

Homens e rios mudam.
Transformam-se a cada manhã.
A cada nova experiência.

É da vida e dos amores.

Será?

II.

Estavam há um bom tempo
separados quando ele,
do nada, reapareceu.

Ela então lembrou, com
o travo amargo das coisas
que se perderam, que ele
sempre foi assim.

Gostava de lhe fazer surpresas.

Para o bem ou para mal…

Qual seria a de hoje?

Braços para trás como
a esconder algo. Não
tinha nada de adivinha,
mas anteviu o passo seguinte.

À sua frente, saltaram
um buquê de flores do campo
e uma caixa de chocolate.

Sempre o mesmo, pensou
enquanto o convidava para entrar.

Ele foi direto ao assunto.

– O que eu preciso fazer
para você ficar feliz?

Entendeu que estava
propondo uma reaproximação.

Por tanto tempo, esperou
por essa pergunta. Por esse
sorriso cínico, mas sedutor. Teria
a resposta pronta e certamente
seria a que ele esperava agora ouvir.

Mas, o que lhe deu hoje?
Nada se alterou. O coração
continuou o baticum suave,
sequer ameaçou atropelar
a razão que, por sua vez,
deixou o seguinte recado
na caixa de mensagem
da consciência:

“Difícil alguém querer
fazer você feliz quando
já lhe magoou tanto
com o próprio egoísmo”.

Ela traduziu assim:

— Faça o que tiver que
fazer por você mesmo.
Realize um único sonho
e eu ficarei feliz de revés.
Assim mesmo, como ver o mar.

Mulheres, mulheres, ele pensou
e se foi a cogitar a possibilidade
de um dia voltarem a ser o que eram.

III.

Na semana seguinte, ele reapareceu
com um carro esportivo, rebrilhando
de novo. Era um projeto ainda dos
tempos de rapaz. Sempre adiado…

— Fiz o que me pediu.
Quero que venha comigo.
Vamos ver o mar. Será
a primeira pessoa a andar
comigo no carro
e a definitiva vida afora.

Ela se disse feliz
porque viu renascer nele
o espírito de aventura.

Mas, como acreditar?
Sabia dos seus impulsos
e das suas recaídas…

Viveram tempos difíceis
de perdas e tristezas.
Ele não se conformava e,
então, passou a culpá-la
por tudo de ruim.

Entraram em parafuso.
Parecia que abdicaram da
própria existência.

Ele foi ficando cada vez
mais mal humorado.
Cada vez mais triste.

Não queria mais
viver aquele tormento.
Então, repetiu a frase do
domingo anterior. Com
um custo que só ela
pôde avaliar…

— Estou feliz de revés…

Mas, o olhar continuou
longe e distante como
o de uma moça triste
de um filme que acabara
de ver na madrugada.

Entendeu que jamais conseguiria
ver o mar naquele esportivo, pois seria
abrir mão de uma paz, de um equilíbrio
que só agora conseguia desfrutar.

— Prefiro ir chegando a pé
devagarinho. Farei do meu passo
o caminho a olhar o horizonte
sem medo, sem pressa e com
os sonhos que a manhã me trouxer.
Olhar o mar é só um motivo
para seguir em frente.

IV.

Ele nada entendeu.
Mas, estava tão feliz que
saltou para dentro do conversível
como se ainda tivesse 20 anos.

Ela tinha razão.
Ele nunca deixaria de ser ele mesmo…