Foto: Gianfrancesco Guarnieri, ator e dramaturgo/Portal dos Atores
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Uma lembrança.
A despeito não sei de que assunto, o então prefeito Mário Covas atendeu ao convite do vereador Almir Guimarães e, findo o expediente na Prefeitura ainda no Ibirapuera, compareceu a um jantar no restaurante Galeta Dourada, ali nas proximidades da avenida Nazaré, no Ipiranga.
Além do vereador, estávamos à mesa eu, o inesquecível amigo José do Nascimento, o administrador regional Durval Freire e mais dois ou três nomes que não me recordo agora. Corriam soltos os dias de 1984, ano abençoado das diretas-já e talvez fosse até este o motivo do encontro.
Talvez…
Com o prefeito veio o secretário de Cultura, ninguém menos que o dramaturgo Gianfrancesco Guarnieri.
A conversa transcorreu animada, ora pela proximidade do quarto centenário do bairro do Ipiranga, ora pela projeção de um novo Brasil a partir do momento de esplendorosa luta que vivíamos, ora por assuntos mais mundanos como futebol e… bem, deixa pra lá, futebol…
Foi uma noite singular, única. Em muitas ocasiões percebi Guarnieri falando como se estivesse em cena aberta a visualizar e nos descrever o Brasil pós ditadura. O Brasil que naquele dia chamou “de todos os brasileiros”.
Uma expressão que me marcou profundamente e que utilizei, vida afora, sem lhe dar a devida autoria. De tão natural que me soou, até pensei que fosse minha. Creio mesmo que o vereador, em seus discursos e pronunciamentos, vez ou outra, cometeu a mesma e indevida apropriação.
Há que se reconhecer: foi sempre por uma boa causa.
Conto essa historia agora por dois motivos:
1 – para reparar meu deslize autoral.
2 – seja qual for o resultado das eleições deste ano e a olhar os nomes que se elegeram para o Congresso – salvo raríssimas figuras -, concluo não mais sonhar o sonho impossível. Estamos tristemente cada vez mais distantes do Brasil que Guarnieri, naquele dia e em toda sua obra, apregoou “de todos os brasileiros”.
É isso.
(Afinal 50 anos batucando letrinhas não são 50 meses, 50 dias, 50 horas…)
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*Texto publicado no livro “Volteios – Crônicas, lembranças e devaneios”
O que você acha?