Estão vendo aquela árvore ali, na foto?
Bonita, estilosa; diria, inspiradora.
Pois saibam, meus caros, se pudesse, aquela árvore não seria uma árvore, acreditem?
Não seria, como dizem por aí, “um ser inanimado”.
Quem me contou?
Foi ela mesmo, ora pois. Numa tarde ensolarada, de graça e luz.
II.
Disse mais.
Exatamente, exatamente, não sabe o que gostaria de ser. Talvez um bicho do mato qualquer desses que à noite vem matar a sede no plácido lago que a margeia. Talvez um cão desses festeiros que alegra à família e faz estripulias e outras coisinhas no seu caule. Talvez um pássaro cantante que, vez ou outra, visita seus galhos e folhagens. Ou até mesmo uma dessas aves de maior porte que, raramente, aparecem por ali visto que vivem a cortar os céus em voos panorâmicos e desafiadores.
Até um desses peixes que habitam o fundo do lago, acreditem?, ela pensou ser.
III.
Gostaria de ser qualquer ser vivente que pode ir e vir, sem restrições. Árvore, árvore, não gosta não. Sabe da sua utilidade, da beleza que possui, mas é tediosa demais essa vida de ficar ali vendo tudo e nada, sem poder opinar, sem ter com quem conversar.
Hoje, abriu uma exceção para mim, mas não sabe explicar o motivo:
– A gente (ops, desculpe o jeito de falar) não poder se mover é muito triste, viu? Sem conhecer outros lugares, outras culturas. Difícil mesmo, mas, o que fazer?, vamos tocando.
IV.
Preciso lhes confessar – e acho que vocês que me leem, sabem – não sou dado a falar com árvores, animais, pássaros e outras figuras do mundo vegetal e animal. Este era um dom de São Francisco – e eu estou bem longe de qualquer odor de santidade, reconheço.
Mal e mal me faço entender e entendo quem está ao meu redor.
Para ser sincero, não sei como entrei nessa. Pode ser um sonho. Pode ser um dos tantos devaneios de quem, como eu, tem uma tendência a ficar imaginando coisas ou pode ser mesmo que alguém tascou algum teretetê na coca light (acho que sou um dos raros dinos que ainda procura aquela coca da latinha prateada) que acabei de tomar.
Não sei, pode ser…
V.
O que sei mesmo é que me encho de brios – já que o papo estava rolando solto – e não seguro a pergunta que não quis se calar.
“O Dona Árvore Falante, com todo o respeito, a senhora nunca pensou em ser assim um humano, assim como nós? ”
Ela sacudiu as ramagens, e foi direta e reta na resposta:
– Humano? Nunca. Que o Criador me livre. Vocês não são de confiança, não. São futriqueiros, invejosos, egoístas e tão pondo o Planeta todo em risco. Ô raça!
E completou em seguida:
– Prefiro ficar onde sempre estive. Quer uma prova? Aposto que você vai espalhar pra todo mundo o que hoje conversamos aqui?
“Eu??? Imagine, Dona Árvore.”
VI.
Nesse momento, passou uma garotinha saltitante pelo gramado diante de nós. Linda, graciosa, ares de sapeca.
A Árvore Falante não se conteve:
– Ao contrário de nós, vocês, quando crescem, perdem toda a graça.
O que você acha?