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Escova e Alicinha (III)

Diz a canção:

“A gente nunca sabe bem o que é que quer uma mulher”.

Há homens tolos que ainda duvidam da correção dos versos de Caetano Veloso em “Pecado Original”.

As mulheres, no entanto…

Bem, as mulheres, minimamente normais, têm plena convicção de que, em determinados momentos, não sabem o que fazem, o porquê fazem e quais as conseqüências do que fazem.

Aliás, este é o grande barato de ser mulher.

Na manhã do dito-cujo encontro com Escova, ela acordou assim.

Despediu-se do marido no café da manhã com um sorriso, um longo beijo e a certeza de que aquela ‘brincadeira’ de almoço já havia ido longe demais.

Inventaria uma desculpa – e não iria.

Minutos depois, ao deixar a filha com a tia da van que a levaria para a escola, deixou recomendações claras para trazê-la no horário e certificar-se se a babá a levaria para dentro. Estava “entupida” de trabalho – e talvez não viesse para casa antes do anoitecer.

Estranhou a mentira que acabara de inventar, mas aplaudiu, interiormente, a naturalidade com que ‘fechou’ o assunto.

No trabalho, por mais de uma vez, surpreendeu-se conferindo o visor do celular para saber se havia alguma mensagem.

Do Escova, claro.

Nesse joguinho de vou-não-vou, sequer notou a manhã passar.

Quando deu por si, já estava dividindo uma mesa de canto no restaurante, com aquele pilantra que mal conhecia, mas bem sabia das suas intenções.

O lugar era sem charme. Seguro, no entanto.

Por certo não haveria nenhum conhecido de ambos nas redondezas.

Incrível reconhecer. Sentia-se segura, levemente inconsequente, e com a convicção de que tudo não passaria de almoço, sem maiores consequências.

— Um dedinho mais de vinho, por favor. Mas só um pouquinho.

Nunca saberemos se foi o tal “dedinho de vinho” ou outro fator qualquer. O fato é que Alicinha foi gostando do jogo jogado. Quanto mais Escova, o predador, aproximava sua cadeira da dela e esticava o braço para roçar seu ombro como se fosse íntimo, mais a moça ia perdendo a noção do perigo.

Tanto que resolveu atiçar os humores e desejos do velho Dom Juan das Quebradas dos mundaréus.

Sutil como um elefante em uma loja de louça, ela provocou:

— Pensei que fossemos a um lugar mais tranquilo, um cantinho onde pudéssemos ficar mais à vontade.

Queria vê-lo sem jeito.

Escova era experiente no assunto:

— Por isso, não. A duas quadras daqui existe um flat ótimo. Deixei para tomarmos lá o licor. Eu nunca deixou de satisfazer as vontades de uma mulher, ainda mais linda como você.

Ele continuou o xaveco. Ela nada mais escutava, envolta na aflição de embarcara numa canoa furada e lhe pareceu ali – não tinha volta.

E agora?

Olha o tamanho da enrascada que entrara.

* Continua amanhã…

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