Três minicontos inspirados no filme Um Dia de Chuva em Nova York (foto)
…
I.
– Sonhei com a ‘a mulher dos meus sonhos’.
Ele me diz – e completa:
– Estava linda!
Pego de surpresa pela confissão do jovem amigo, respondo com o óbvio:
– Uia! Que legal! Foi bom, então…
– Foi péssimo.
Ops.
Fico sem ação, mas estico o papo:
– Como assim?
E ele, bem sem graça, satisfaz minha curiosidade:
– Me tratou com desdém, como sempre faz no sonho e fora dele.
Rapaz, fica assim, não, digo e reitero:
– Esquece a moça, esquece a moça…
– Já esqueci.
E, desacorçoado, conclui:
– Na vida real, até que foi maneiro. Consegui. Acho. Agora, nos sonhos, é que está difícil.
Ô dó!
II.
Aquele outro rapaz vive outro tipo de questionamento.
– Não sei se caso ou se compro uma bicicleta?
Achei divertida a fala do amigo.
– Não ri, não – ele diz.
Tranquilo, camarada, já ouvi e vi de (quase) tudo nessa vida. Você não é o primeiro a discorrer sobre esse transcendental impasse.
– Esse dia sempre chega, né?
Não sei se está me perguntando ou se está convicto da inevitabilidade das coisas como elas são.
A decisão é (e sempre será) do envolvido; neste caso, ele mesmo.
…
Daí, o silêncio naquele preciso instante em que a morena Dagmar – da estirpe daquelas que o saudoso Sargentelli dizia atender a “400 talheres” – invade o recinto com suas extravagantes beleza e malemolência.
Véspera de carnaval, certamente a moça vai arrasar no sambódromo.
Todos reconhecem a sua boa forma e a fama.
Inclusive o nosso amigo que acompanha cada movimento da beldade com os olhos arregalados e, seguramente, mil e uma ideiazinhas na mente e no coração.
– Quer um conselho?
Sou eu a quebrar a mudez de ambos.
– Hã?
– Quer um conselho, rapaz – insisto por conta e risco:
– Compra uma bicicleta!
(E não se fala mais nisso.)
III.
Olhem o embaraço!
O filho de um amigo me procura em busca de ajuda.
Tem pouco mais de 20 anos, olhos vermelhos, aspecto cansado e algum açodamento nos gestos.
…
Ele me conta que a doce e meiga Drica pediu um tempo. Quer repensar a vida e a relação que ambos vivem (ou viveram?).
Ele não se conforma.
Eram tão felizes, amavam-se tanto, tanto – e agora a Drica (que não tenho a honra de conhecer) vem com essa conversinha: é muito jovem para um namoro tão a sério, tem que viver outras tantas experiências, conheceram-se ainda no Colégio e as desculpazinhas de sempre.
…
Então…
Faço a inevitável pergunta:
– Ela tem outro?
Sinto o baque do rapaz – e certo descontrole:
– Não, claro, que não. Tá louco, tio?
Não sou parente dele, mas estou disposto a ajudar.
– Tem certeza, pergunto.
E ele quase entregando os pontos:
– Tenho, perguntei pra uma amiga dela que me confirmou. Ela está sozinha, só quer um tempo mesmo!
…
Já disse: estou disposto a ajudar, por isso considero pertinente fazer uma observação:
– Não quero ser chato, não. Mas, repare, você fez a pergunta certa pra pessoa errada. Lembre que a amiga é dela; não, sua, ok?
O que você acha?