VI.
O amigo repetiu o concerto numa tarde de quinta-feira (dia de fechamento da edição) no saguão de entrada do jornal.
Dá-lhe Cabocla – e à capela.
Era um dia daqueles. Tudo atrasado e o tempo comendo solto. Não conseguíamos parar quanto mais dar atenção aos trinados do Já-Já. Ele se esquecera da malsucedida carreira política, curtia sua aposentadoria e tinha tempo de sobra para investir no projeto do livro sobre Jânio.
Nos intervalos, fazia lá as suas serestas.
Penso que a Redação era um lugar onde se sentia acolhido. Ficava à vontade.
Tão à vontade que naquele dia, como não tínhamos como atendê-lo, resolveu cantar Cabocla à toda voz no local mais inadequado possível.
Num espaço minguado de, sei lá, de 40 metros quadrados, se tanto, juntou oficce-boys, atendentes, agenciadores publicitários, o pessoal que estava anunciando no balcão, quem estava no ponto de ônibus em frente, vizinhos e por aí vai.
Um mundaréu de gente para ouvir o nosso cantante.
Do primeiro andar ouvíamos a confusão – e não quisemos acreditar.
Já-Já transformou em palco o primeiro lance da escada e, àquela altura, sentia-se o próprio cantor das multidões.
Só parou de cantar quando um dos nossos, quase de joelhos, implorou para que nos deixasse terminar o jornal.
Ele aquiesceu – mas, deixou implícita uma ameaça.
— Semana que vem eu volto, gente. Vou trazer um amigo que toca violão.
VII.
Lembro do saudoso Jacob Meyer Júnior, com certa nostalgia dos tempos idos e vividos.
É inevitável.
Tenho a sincera impressão que sonhadores pirados como Já-Já não cabem mais na tal pós-modernidade que, dizem, vivemos.
Sei também que estão em extinção as redações como aquelas que vivi nos anos 70 e 80.
Visitei recentemente a de um tradicional jornal paulistano. Era um silêncio, uma organização, quase uma linha de produção.
Aliás, é preciso que se diga:
Hoje, no primeiro Caboclaaaaaa que um romântico qualquer entoasse no hall de entrada de alguma empresa, qualquer empresa, os seguranças baixariam o cacete sem esperar o segundo verso.
Eu sei que vocês vão dizer que sou saudosista…
Não discordo.
Digo apenas que a vida era mais divertida e solidária.
E saibam: mesmo que nenhum de nós tenha lido o que estava escrito no tal caderno do Já-Jám – e talvez até por isso – demos a maior força para que ele transformasse em livro as tais anotações…
Convenhamos.
Éramos divertidos, solidários e… um bocado cínicos