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Jornal do Brasil – Memórias de um Secretário, Pautas e Fontes

por Alfredo Herkenhoff

Este livro nasceu, fundamentalmente, como uma explosão emocional na esteira do anúncio feito pelo JB, estipulando o 1º de setembro de 2010 como data do encerramento do ciclo das edições impressas, passando o diário centenário a ter somente versão digital na internet. Iniciado nos anos 90, escrito em boa parte entre 2004 e 2005 e finalmente arrematado em 2010, Pautas e Fontes contém dezenas de depoimentos de profissionais com passagens, na maioria, pelo Jornal do Brasil.

Sem abrir mão de sua estrutura original de caleidoscópio, o livro procura revelar, de forma meio funambulesca, os valores, os preconceitos, a arrogância e o humor de todos nós. Pretende ser uma contribuição para quem quiser conhecer aspectos pouco divulgados do cotidiano da produção de reportagem.

Deu no JB em 14 de julho de 2010: “O Jornal do Brasil, coerente com sua tradição de pioneirismo e modernidade, se coloca mais uma vez à frente do seu tempo. A partir de 1º de setembro de 2010, passa a ser o primeiro jornal 100% digital”.

Este anúncio informa que, com a mudança, o preço da assinatura cairá de R$ 49,90 para R$ 9,90 por mês. O jornal fala em modernidade, como se versão digital fosse coisa nova. O JB foi o primeiro a entrar na internet no país. O comunicado tenta dar uma ideia de modernização, quando aparenta apenas anunciar a paralisação das edições impressas. Estima-se que a mudança vai provocar corte de pessoal entre os últimos colegas do JB, que morre na banca e assim entristece os valorosos 180 últimos funcionários, dos quais 60 na redação.

O gestor Nelson Tanure disse apenas que o jornal fez uma consulta aos leitores pela internet em junho de 2010 e eles apoiaram a mudança. Mas soou estranho uma casa que já teve quase 80 mil assinantes, um público altamente qualificado de leitores, anunciar que “o JB vai sair do papel e entrar para a modernidade”.
Pedro Grossi Jr., presidente do JB, anunciou o seu desligamento da casa por considerar que o anúncio do fim da edição impressa era inaceitável. Ele estava no cargo desde março de 2010, tendo antes trabalhado no setor de marketing do jornal. Pedro Grossi não escondeu de ninguém que ficou magoado com Nelson Tanure, com quem há anos vinha trabalhando.

Converso com colegas jornalistas e vou observando nossas emoções. Acostumados que estávamos, e estamos, com tantas mazelas político-sociais, queremos sempre apontar culpados, nem que para isso difamemos ou desonremos alguém. Especialmente quando o tema suscita tantas paixões como é jornalismo e como é o JB.

Causas e culpas envolvendo a decadência do Jornal do Brasil demandam investigação profunda e análises múltiplas. Não consigo, pessoalmente, condenar ninguém aqui e agora. Não me sinto confortável para pretender ser a palmatória do mundo. Não tenho como definir se foi a ditadura, a concorrência ou os desmandos administrativos que levaram o JB à degradação. Talvez, o conjunto desses fatores.

E o que está em jogo não é a honra dos verdadeiros chefes do jornal nos últimos 50 anos: Dr. Manoel Francisco do Nascimento Brito ou seu filho, José Antonio, o Josa nos Anos 90, ou do gestor da marca, Dr. Nelson Tanure, no Século XXI. Poderia parecer grito no escuro qualquer tentativa de, nessa hora tão difícil, acusar e ridicularizar os três comandantes de um navio à deriva há décadas e enfrentando concorrência avassaladora de O Globo a partir do nascimento e crescimento da TV Globo em 1965. O processo de decadência também é fruto de cultura do desperdício de recursos e de sua má aplicação.

O Jornal do Brasil padece de uma longa crise financeira, uma bola de neve de passivos fiscais e trabalhistas, pouca diferença fazendo definir se a dívida totaliza 100 milhões disso, ou 100 milhões daquilo, 1 bilhão de reais ou 1 bilhão de dólares. Impagável sem uma costura política que atraia capitais de forma segura.

Com a migração para a “modernidade”, predomina o temor das últimas demissões. Para muitos vai ocorrer isso sim, mas, por outro lado, temos exemplos de jornais e revistas que já nasceram exclusivamente no suporte digital e fazem grande sucesso no exterior. Nos Estados Unidos, por exemplo, o Huffington Post (HP) é um case digno de estudos, a caminho de receber 10 milhões de hits por dia. Na Itália, o site Dagospia está bombado há anos, e sempre crescendo. Visitar endereços como esses se tornou hábito cotidiano mesmo entre velhos leitores do The New York Times e Corriere della Sera.

Os filhos de Dr. Brito reagiram ao anúncio de Tanure com poucas palavras. Disseram nada saber dos planos do gestor. O fim da edição impressa do JB foi noticiado imediatamente pelos principais jornais do Brasil e do Mundo.

A decadência do JB começou a se tornar mais visível nos anos 80, na esteira da crescente concorrência de O Globo ancorado na publicidade maciça da televisão desde a década anterior. Mas antes de se tornar visível, a sentença de morte já havia sido proferida. Josa disse numa ocasião que o JB, para ter o mesmo número de minutos de publicidade do Globo na TV Globo, precisaria gastar 40 milhões de dólares apenas em um ano.

Na virada dos anos 80 para os anos 90 afloraram as grandes crises financeiras no JB, os primeiros atrasos no pagamento de salários. Os bancos, que antes premiavam erros administrativos do JB mediante sucessivos empréstimos, fecharam a porta para a família Brito.

A circulação começou a cair vertiginosamente.

Não foi surpresa quando, em 1995, o Banco Nacional quebrou, e ninguém noticiou que o JB, só a esta instituição da família Magalhães Pinto, devia cerca de 50 milhões de dólares. Pelo menos é o que o alto escalão na redação, nas internas, dizia na época. Pouco depois, quebraria o Banco Econômico, e de novo lá estava o JB na lista dos maiores devedores, algo em torno de 10 milhões de dólares, sempre segundo editores com quem privei naquela correria de atualizar e melhorar a edição em cima do fechamento ou já durante a rodada, posto que ainda havia luta renhida com o concorrente O Globo. Era um tempo em que o real praticamente tinha paridade com o dólar, daí porque tanto se falava em moeda brasileira quanto americana.

O brocardo jurídico “onde não há até o rei perde o direito” se aplicou bem ao jornal. O JB perdeu o crédito, não mais conseguiu facilidade para rolar a bola de neve. Aqui um parêntese: houve um tempo em que os vínculos entre grandes jornais e bancos eram tão estreitos que o Nacional, por exemplo, chegou a criar, informalmente, uma gerência especial para cuidar dessas relações com a elite da imprensa. Um nome de destaque do jornal podia entrar em qualquer agência do Banco Nacional e ir diretamente ao caixa para dizer: preciso levar 5 mil. O rapazola estranharia e iria ao gerente. Este daria um telefonema. Minutos depois, o empréstimo efetuado, e o jornalista ou diretor sorridente ouviria: assina aqui esse papelzinho para parecer que não é uma doação. Resta saber se a tal dívida de 50 milhões incluía esses papagaios que velhos atrasadores, amigos dos poderosos, pegavam para comemorar mais uma edição de sucesso. Deu no que deu. E hoje, se alguém se dispusesse a calcular juros superpostos, e escorchantes, não poderia descobrir que o JB deve bilhão de dólares de reais? O número, não importa qual moeda, é tão grande que se tornou ridículo, um valor irrisório. A dívida foi consolidada, morta pelo tempo. No longo prazo estaremos todos mortos, incluindo os centavos dos trilhões. A dívida do JB virou um mistério a engordar os sucessivos rombos da impossibilidade da viúva. Cifras como óvulos estéreis.

Entre tantas manobras financeiras, nada sobrou mesmo para pagamento prioritário das indenizações a funcionários, como manda a lei, e não a cumpre tão bem a Justiça do Trabalho em se tratando de jornal.

Tanure entrou de fato na empresa em 2001, mas ao contrário das expectativas, investiu pouco e mal. Em 2003, o jornal ensaiou um crescimento nas vendas. Mas Tanure já tinha tomado gosto pelo troca-troca de comando na redação. Veio o pessimismo. Alterando parâmetros a torto e direito, o jornal virou tabloide. Os anos foram passando e nada. Algumas tentativas como a de oferecer o jornal a R$ 1 deram algum ímpeto. Mas neste 2010 o JB mostrou a debilidade em números cruéis: venda de apenas cerca de 15 mil exemplares por dia.

Pedro Grossi disse de público que gostaria que o jornal continuasse na versão impressa, não sendo segredo nenhum de que o ex-presidente negociou alternativas nos bastidores, apesar de tanto descrédito, tantas dívidas, tantas dificuldades.

Revista Forbes, Editora Peixes, JBTV na CNT, Gazeta Mercantil! Definitivamente, a julgar pelos ‘‘primeiros” 10 anos, Tanure não casa bem com comunicação. Provavelmente sentiu que seu 31 de agosto seria triste, homem deprimido por não ter conseguido manter o JB nas bancas ao amanhecer de 1º de setembro. Para além dos erros que Tanure cometeu, não acredito que qualquer outro empresário pudesse ter salvado o jornal com tamanha dívida e com uma legislação engessada, responsável em boa parte pelo atraso da economia brasileira na globalização.

Tecnicamente, a família Brito arrendou a marca JB por 60 anos à Companhia Brasileira de Multimídia (CBM), controlada pela Docasnet, de Tanure. A CBM também arrendou a marca Gazeta Mercantil em 2003/2004, mas este jornal de economia saiu das bancas em 2009. Ou seja, Tanure não compra jornais, apenas compra o direito de usar as marcas pelo período que julgar necessário, de 60 anos a seis meses. Apenas aluga as marcas. E a bem da verdade, Tanure não matou o JB. Garantiu-lhe uma frágil sobrevida de 10 anos. Apesar de todos os erros, este mérito ninguém tira do controvertido empresário baiano.

Talvez ninguém concorde com minha opinião, mas mesmo no meio deste caos, notei que havia pessoas torcendo, no fundo, para um dia poder saudar Nelson Tanure como o entrepreneur que, além das aparências, contra todos os débitos e enfrentando tudo, descrédito e especialmente a própria inexperiência, saísse vitorioso dessa aventura de salvar o Jornal do Brasil, primeiro da família Nascimento Brito, depois dele próprio.

Até eu me vi nesse pequeno grupo, torcendo, mas a cada instante com menos esperança. E assim chegamos a setembro de 2010 com a sensação de que o JB chegou ao fim da linha porque o anúncio de que passará a ter só edições digitais é semelhante ao feito por ocasião do encerramento da versão impressa da Gazeta Mercantil, que Tanure fechou em junho de 2009. E desde então nada de Gazeta 100% digital.

Por outro lado, contra a opinião geral, o JB poderia sim ter a agonia deste 2010 prolongada para assinantes acreditando na fase da versão digital. Mas se no tempo que não se cobrava pelo acesso ao site do JB não havia tanta visitação por que acreditar agora que o portal vai ter sucesso ao preço de R$ 9,90 por mês? O problema não será o preço, mas a qualidade do serviço.

E mesmo com menos esperança, e apesar da contribuição milionária de todos os erros de Tanure e dos que o precederam, ainda vejo vivo o Jornal da Condessa, preso à vida por um fio digital.

Para uma sobrevida adicional, o JB precisaria de um apoio emergencial, como o que Tanure lhe deu em 2001, mas agora investimento a ser tocado a partir da experiência dos jornais digitais que mais fazem sucesso no mundo. Os portais brasileiros de maior público são poucos e bem conhecidos, são concorrentes entre si e representantes de grandes empresas num caldeirão de mexericos e notícias curtas e chapadas que emergem do sistema de clonagem total via control C, control V.

Já empreendimentos vitoriosos, como o citado Huffington Post, sim, estes merecem um estudo para pensar perspectivas de o JB tirar lições e multiplicar leitores como se fossem peixes milagrosos, internautas ávidos da melhor qualidade a ser oferecida. O Huffington é um portal de visita diária obrigatória de milhões de pessoas porque são janelas ágeis, claro, sim, veículo pleno de control C e control V, mas este recurso usado com o sentido de edição voltado para o interesse do internauta, o leitor vendo o melhor que se edita em tempo real, 24 horas por dia, com o melhor conteúdo jornalístico, dos EUA e do mundo, para públicos específicos, ou com o melhor conteúdo estrangeiro vertido para a língua hegemônica. Internautas que o visitam recebem avisos de conteúdo específico. Se eu gosto de esporte, posso receber mensagens de twitters do Huffington neste campo. E assim por diante, se gosto de mexerico de Hollywood verei nesse HP o melhor de Angelina Jolie etc. Se gosto de fotos e youtubes, verei as melhores novidades do dia via HP 100% digital. E assim esse jornal exclusivamente da web vai numa pegada incrível. Recebe apoio de empresas grandes e pequenas, de gente comum ao presidente Barack Obama. O Huffington vai criando uma massa de seguidores fieis a devorar o conteúdo apenas das editorias de maior interesse de cada grupo desses leitores-internautas.

Será que o JB, neste momento tão difícil, tem bala para surpreender mais uma vez? Se o JB Digital bombasse, ainda assim os recursos dos anunciantes seriam arrestados por ordem judicial para fazer frente ao passivo trabalhista da fase impressa pré-Tanure. Então, não. Não se vê luz no fim do túnel. O JB impresso está desaparecendo por causa da confluência de fatores negativos como se pode observar, neste Memórias de um Secretário, nas análises de figuras emblemáticas como Alberto Dines, Wilson Figueiredo e Nilo Dante.

O desaparecimento total das bancas só se tornará uma fênix digital se os Três Poderes em Brasília tomarem a decisão política de assumir a parcela maior do ônus. O JB está sendo riscado do mapa das bancas porque isso parece também desejo dos ocupantes dos palácios que Oscar Niemeyer projetou no Distrito Federal, com burocratas no topo do poder desprezando o troco que a História lhes reserva por ignorarem que bom jornalismo e boa educação são as faces de uma mesma moeda chamada desenvolvimento social.

Esses últimos parágrafos são quase um lugar-comum, voz corrente, opinião da maioria na ladainha de lamentos da chamada Família JB. Mas é emocionante receber a colaboração do velho diagramador especial Nelio Horta — um baluarte do jornal desde o tempo da condessa — exalando esperança, otimismo no caos, dizendo-nos, em seu depoimento para este livro, que o JB Digital já é uma realidade. Emoção semelhante me causou o otimismo de Wilson Figueiredo no texto que enviou a este nosso livro.

O objetivo do instant book, além de uma confraternização entre profissionais da imprensa no Rio de Janeiro, é mais contribuir para aguçar espíritos críticos do que afirmar certezas sobre uma segunda chance para o JB. Sem nenhuma linha cronológica, ou linha do tempo, Pautas e Fontes dialoga com a História mas sem sequer fazer um levantamento de todas as versões ou interpretações relativas à extinção de tantos jornais e à quase morte do JB.

Mas sim, boa parte do meu tempo ao iniciar este livro contemplou um sonho — frustrado — de promover reflexões que ajudassem o JB a escapar do processo de decadência que ganhou ímpeto nos anos 80.

Como novidade editorial, o livro contém algumas pautas que, por acaso, não foram jogadas no lixo da redação, como é praxe. Sem maiores critérios de importância, algumas dessas pautas sobreviventes estão agora ilustrando uma faceta rotineira de profissão tão ligada ao acaso. Estão aqui como foram forjadas no ambiente original no Jornal do Brasil na última década do Século XX. Algumas estão condensadas, congregando tempos diferentes do desenrolar do noticiário. Algumas estão agrupadas com outras de casos semelhantes, formando um álbum de figurinhas sobre agitação jornalística. E por mais corriqueiras e sem importância que sejam algumas dessas pautas, algumas formuladas por mim quando fui chefe de reportagem, outras por gente que nem sei mais quem foi, tem elas na maioria a “assinatura anônima” de José Gonçalves Fontes. A decisão de guardá-las é fato raro no jornalismo e na sua literatura.

O livro tem um pouco daquela marca que, nesses tempos eletronicamente tribais, é refletida pela expressão “ex-JB”, família de ex-funcionários que cresceu na medida em que as dificuldades do setor impuseram degradação das condições de trabalho. A redução de quadros se dando por necessidade de contenção de custos, com demissão forçada e, ao mesmo tempo, por decadência financeira que afugenta diversos jornalistas. A família ex-JB brilha por todo canto, sempre saudosa, torcendo não por um “passado tão risonho, que não volta nunca mais”, como na música de Noel Rosa, mas, pelo menos, para que a velha casa continue a merecer o respeito da sociedade. Este livro começou a ser pensado por profissional do JB. Na conclusão da obra, a família ex-JB estava um pouco maior, ou mesmo completa, na porta do inferno das ruas do desemprego, com toda esperança deixada de lado.

Muitas passagens do livro são didáticas, voltadas não para jornalistas amigos, mas para estudantes de Comunicação aturdidos com a decisão da Justiça de acabar com a exigência de diploma para exercer a profissão. São muitos exemplos e orientações sobre relacionamento com repórteres. Esse aspecto talvez tenha serventia para jovens querendo descobrir vocações e também assessores de imprensa. Outras passagens produzi pensando num afago a velhos colegas da profissão, havendo nessas páginas uma oportunidade para relembrar bons momentos, ou um pretexto para matar saudades.

O jornalismo, como instituição, recebe um foco em seus bastidores. No meu olhar íntimo de autor, o livro é, basicamente, de memórias afetivas de um secretário na cozinha da redação. Casos folclóricos permeiam o ritmo vertiginoso das páginas num processo doloroso que entrega, de bandeja, momentos de fraqueza e pitadas de intrepidez. Também há relatos de dezenas de jornalistas sobre a emocionante experiência de produzir reportagem.

Ao longo deste livro, que é um exercício de liberdade, não há preocupação, propriamente, com a precisão histórica dos fatos, ou com o seu desfecho ou sua grandeza, mas com experiências e reflexões no ofício de informar. Os fatos e os jornais em que algumas situações se desenrolaram são elementos, eventualmente, coadjuvantes, não necessitando os fatos de extensas explicações, nem os jornais de menção explícita o tempo todo. Desse modo, no conjunto, os jornalistas aparecem aqui como integrantes de uma instituição só, independentemente dos jornais em que estejam prestando serviço.

Eventual omissão de nomes é inevitável entre centenas de menções. O ambiente é a instituição, são todos os jornais e todos os jornalistas. Uma omissão, se deliberada, pode até ser entendida como antijornalismo, sonegação de informação. Aqui, sem objetivo de alcançar o impossível, há uma tentativa de citar o maior número possível de coleguinhas da família JB, mero aceno aos bons tempos, entre saudades e uma esperada confraternização.

Tomara que a leitura possa propiciar, para além das falhas, que não são poucas, um pouco de prazer e reflexões sobre os casos descritos e sobre a própria profissão. A leitura também permite descobrir erros e suscitar dúvidas.

Reunindo uma razoável quantidade de informações, ainda assim, este livro é apenas mais um que contribui para quem se dispuser a fazer levantamento mais completo sobre jornalismo carioca e seus profissionais na segunda metade do Século XX e no início do Século XXI.

Com a decisão de escrevê-lo, a homenagem, já no título, ao repórter José Gonçalves Fontes, um recordista de Prêmios Esso para o Jornal do Brasil e que morreu de câncer em 31 de julho de 2000. Tendo no próprio sobrenome a origem de toda boa reportagem, Fontes era dono de excepcional tirocínio para detalhar os aspectos possíveis de uma investigação jornalística. Fontes organizava pautas que nem sempre o jornalismo corrido dos dias de hoje costuma explorar integralmente.
Em algumas velhas pautas, Fontes se intitula “Advogado do Diabo” para deixar claro que se deve desconfiar da própria sombra quando se trata de apuração jornalística. O colega seguia à risca aquele ditado russo que talvez até desconhecesse: “Confie, mas verifique.”

Seria o livro tão efêmero quanto um jornal, não tratasse justo do aspecto passageiro dos fatos e de sua produção como notícias. Trata-se, portanto, de um exercício sobre lembranças, sobre o tempo das notícias e sobre o próprio tempo, escasso, que nós, jornalistas e leitores, temos para nos mostrarmos ágeis e nos interessarmos por elas. Trata-se de uma reflexão sobre o cotidiano do jornalismo.
Em toda pauta, o verbo mais constante é o “ir”. A primeira pessoa e a terceira do singular se confundem algumas vezes na primeira do plural. A conjugação firme do “vamos” denota o aspecto coletivo da produção de notícias nos grandes jornais. O livro reflete esse anonimato. Apesar de misturar o tempo dos verbos e de haver o uso da primeira pessoa, tende à impessoalidade e à atemporalidade entre reflexões do dia a dia da profissão.

Apresentado como um caleidoscópio, Memórias de um Secretário é, num certo sentido, uma antinotícia ou um lado escondido dela, como o mundo subjetivo dos repórteres e a relação que mantêm com a profissão.

Fragmentos de história, Pautas e Fontes é um mosaico, um almanaque. Não demanda leitura linear nem integral. O mundo está abortando não um livro, mas um Capivarol extraído da convivência entre todos nós nesse caldeirão social que é o Rio de Janeiro dentro de um caldeirão maior que é o Brasil no mundo.”