Trabalhei com verdadeiras figuraças nas redações pelas quais andei.
Desconfio mesmo que esses malandros-poetas-jornalistas deveriam ser enquadrados por algum IBAMA da vida boêmia para protegê-los.
Não duvido que são espécie em extinção.
O Marceleza, que não sei por onde anda, é um deles.
Nascido em Ubatuba, criado no Rio de Janeiro, fanático torcedor do Flu, é o paulista mais carioca que conheço. E absolutamente imprevisível em tiradas sempre divertidas e, por vezes, geniais.
Como aconteceu naquela tarde em que entramos em rota de colisão com o pessoal da Redação.
Eu era o editor (quase) responsável. O Marceleza, o sub.
Não lembro qual o motivo. Mas pegamos pesado na reunião de pauta. Alguma coisa tinha nos escapado na edição anterior. Nada de maior relevância. Mas hoje reconheço que nos empolgamos na bronca e fomos além da conta.
Os repórteres saíram de farol baixo do ‘aquário’, como chamávamos a sala de reunião, e não se ouviu mais uma palavra sequer na Redação.
O ritmo cadenciado dos teclados entregava o baixo-astral da rapaziada.
Chamei o Marceleza num canto e lhe falei da minha preocupação.
— Não estou gostando nada disso. Acho que exageramos na advertência. Com esse ânimo, temo que não conseguiremos ‘fechar’ o jornal hoje.
— Deixa comigo.
Mal terminou a frase, o Marceleza deu sumiço da área.
Voltou 20 minutos depois com enorme embrulho nas mãos.
Colocou o pacote sobre o ‘mesão da pauta’ e chamou a todos para uma reunião de emergência.
— Alguma grande notícia, uma “bomba” que mereça edição especial?, perguntei.
— Quase isso, meu caro – ele me respondeu.
Reunidos ao redor do ‘mesão’, ouvimos a voz em tom solene do Marceleza.
— Meus queridos, são todos meus convidados. Voltemos a sonhar juntos…
Ato contínuo, ele abriu o pacote e, então, pudemos ver – e depois saborear – duas dezenas de fartos ‘sonhos’, uma especialidade da padaria mais próxima.
Ninguém resistiu.
E todos voltaram a conversar, a sorrir e, principalmente, a trabalhar com mais vontade…
FOTO NO BLOG: Jô Rabelo