"Eles são muitos. Mas, não sabem voar" (Ednardo)
01. Eu não poderia avacalhá-lo porque avacalhado ele já é. Não me impressiona sua pose de mordomo de filme de terror. A frase do presidente do Senado, o baiano Antônio Carlos Magalhães, foi talvez o ponto alto das escaramuças da semana entre ele e o presidente da Câmara Federal, o paulista Michel Temer. Um bate-boca inócuo que, é bom que se diga, descambou ao rés do chão.
02. Há quem veja nessa discussão apenas o ponto de vista de cada um sobre a extinção da Justiça do Trabalho. ACM é a favor do fim. Temer, não. Seria menos tenebroso acreditar-se que eram apenas questões conceituais. Entretanto, por trás dessa cortina de fumaça e xingamentos mútuos, pode-se vislumbrar a acirrada disputa por mais espaço político no atual mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso e, a médio prazo, uma movimentação de forças com vista ás eleições de 2002 — pior, isso ocorre dentro da própria aliança PSDB/PFL/PMDB que forma a base do Governo FHC.
03. Aliás, não é de hoje que se comenta nos bastidores do Poder. Essa união que garantiu a eleição e reeleição do príncipe dos sociólogos está com os dias contados. Não tem data certa para acabar. Mas, sobrevive por um fio.
04. A bem da verdade, não foi outro assunto que juntou o governador Mário Covas e ACM dias atrás num almoço pouco noticiado. Ao que se sabe, não há grandes afinidades entre ambos. Mas, exatamente o que os une é a inconveniência de ter o PMDB como aliado e a dividir áreas estratégicas do Poder, como a Codesp — entidade que cuida do Porto de Santos — e a Codeba — que cuida dos por tos da Bahia, estado onde ACM é rei e literalmente manda prender e manda soltar.
05. Outro ponto a destacar é que a aproximação entre ACM e Covas surge como uma muralha instransponível para as pretensões de Temer que silenciosamente trabalha para disputar o governo de São Paulo em 2002. A aliança, aliás, assusta inclusive outro tucano famoso, o ministro José Serra, que também sonha alto e, vez em sempre, gosta de atazanar a vida do PMDB.
06. Todas essas rusgas e farpas deixam a mostra uma das características do Governo FHC. Quem está no Poder não se preocupa com coisas chãs como saúde, educação, habitação, emprego e moradia. Preocupa-se, sim, com a grande arte da vida que, segundo os próprios, é permanecer no Poder.
07. Pode ser isso o que lhes basta. Mas, é exatamente o que leva o País a viver dias incertos e ameaçadores. Sombrios até. Como se o Brasil e os brasileiros fossem propriedade deles. Como se nos tirassem o sonho de uma vida digna… E vontade de acreditar… Eles só não percebem que nós já percebemos — e aí estão as denúncias, os escândalos, os esquemas, as nossas cobranças… Falam em mudanças gradativas, lentas, que ainda nos são imperceptíveis. Fingem que mudam para nada mudar. Querem deixar tudo como está, do jeito que melhor lhes aprouver. Não sabem, porém, que já retomamos nosso caminho e, principalmente, a esperança de ser feliz.