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O historiador do samba

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Foto: Edinho Alves/Divulgação

Era uma ensolarada tarde do mais antigo dos anos, os amigos sambistas reuniram-se ao redor da mesa num dos cômodos da casa do compositor Carlos Cachaça.

Bebericavam, lembravam histórias, comia solta a cantoria apoiada no batuque sincopado de velhas canções.

Nélson Sargento, ele mesmo tido e havido como a história viva da Mangueira e do samba, era dos mais animados.

Cismou de provocar logo quem… O ensimesmado  mestre Cartola.

E de que forma?

Pôs-se a cantar, de uma só enfiada, oito sambas do próprio Cartola que nem mesmo Cartola lembrava de ser o autor.

Desaforo?

Nada disso. Pura (e privilegiada) memória.

Sargento ria diante do espanto do mestre – e da admiração dos demais.

Ria e fazia o desafio:

“Se o mestre me der parceria, canto mais oito…”

Era o relato que corria na velha redação do Diário da Noite, ali, pelos anos 70 quando por lá estive, por duas semanas, em busca do meu primeiro emprego como repórter-estagiário.

Confirmei a veracidade da historieta, tempos depois, ao ler a contracapa do álbum Sonho de Um Sambista,  precioso registro da obra de Nélson Sargento, lançado em 1979 pelo selo dos Estúdios Eldorado.

Quem assinava o texto era o jornalista Arley Pereira que, a bem da verdade, eu só conhecia na função de jurado de programas de calouros na TV – e que, na verdade, era um dos grandes cultores do gênero e estava entre os responsáveis pela redescoberta pra valer de notáveis e esquecidos sambistas cariocas como Cartola, Nélson Cavaquinho, Carlos Cachaça, Billy Blanco, Nélson Sargento, além dos paulistanos Adoniran Barbosa e Geraldo Filme.

Outro nome importante nesse garimpo e empreitada foi o produtor musical João Carlos Botezelli, mais conhecido nas lides artísticas como Pelão.

Todos esses nomes de bambas – e mais alguns, igualmente importantes – gravaram seus discos de estreia sob a direção de Pelão pelo mesmo selo e na mesma década de 70.

Por essa época, eu já era repórter na área de Cultura, trabalhando exata e felizmente na cobertura de shows e lançamentos na área musical.

A bem da verdade, foi quando tomei conhecimento da carreira e da obra do carioca Nélson Matos, apelidado de Sargento pelos tempos que andou no Exército. Era artista plástico (de linhagem primitiva, alguém me disse), mas um inveterado defensor do samba, a quem dedicava toda sua vida.

Para Nélson Sargento, o samba era uma instituição nacional.

Fez mais de 400 sambas. Participou do grupo Os Cinco Crioulos ao lado de Elthon Medeiros, Jair do Cavaquinho, Anescarzinho do Salgueiro que revelou Paulinho da Viola pra os palcos da vida.

Foi parceiro de cena de Clementina de Jesus e Aracy Cortes no igualmente histórico musical Rosa de Ouro, de Hermínio Bello de Carvalho.

E esteve ao lado do compositor  Zé Ketti  no conjunto A Voz do Morro, outra referência do renascimento do samba como nosso principal gênero musical.

Nélson Sargento morreu ontem no Rio de Janeiro aos 96 anos.

Era vascaíno da gema, integrante da ala de compositores da Mangueira, outra de suas grandes paixões.

A cantora Alcione assim o homenageou em suas redes sociais:

“Para mim, ele sempre pareceu um lorde na maneira de se comportar, de se vestir e de falar. Era um desses galhos fortes do nosso jequitibá o samba, que é a Mangueira. Tenho maior orgulho de pertencer a essa escola também pelo Nélson Sargento. Orgulho do samba. Descanse em paz.

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