Muitas vezes me perguntaram quando escrevi o meu primeiro poema, quando nasceu em mim a poesia.
Tratarei de lembrar.
Muito longe na minha infância e tendo apenas aprendido a escrever, senti uma imensa emoção e tracei algumas palavras semi-rimadas mas estranhas a mim, diferentes da linguagem diária. Passei a limpo num papel, preso de uma ansiedade profunda, de um sentimento até então desconhecido, espécie de angústia e tristeza. Era um poema dedicado à minha mãe, isto é, a que conheci como tal, a madrasta angelical, cuja sombra suave protegeu toda a minha infância.
Completamente incapaz de julgar minha primeira produção, levei-a a meus pais. Eles estavam na sala de jantar, mergulhados em uma dessas conversas em voz baixa que dividem mais que um rio o mundo dos meninos e dos adultos.
Desdobrei o papel com as linhas, trêmulo ainda com a visita da primeira inspiração.
Meu pai, distraidamente, tomou-o em suas mãos, leu distraidamente e distraidamente me devolveu, dizendo:
— De onde o copiaste?
E continuou conversando em voz baixa com minha mãe seus assuntos importantes e remotos.
* O relato acima foi feito pelo poeta chileno, Nefatli Ricardo Reyes Basoalto(1904/1973), que conquistou o Premio Nobel de Literatura em 1971. E tornou-se mundialmente conhecido como Pablo Neruda. O texto está no livro “Confesso Que Vivi”, meu inseparável companheiro nesses 15 dias de estio.
— Amo tanto as palavras… As inesperadas… As que avidamente a gente espera, espreita até que de repente caem… Vocábulos amados… Brilham como pedras coloridas, saltam como peixes de prata, são espuma, fio, metal, orvalho… Persigo algumas palavras… São tão belas que quero colocá-las todas em meus poemas… Agarro-as no vôo, quando vão zumbindo, e capturo-as, limpo-as, aparo-as, sinto-as cristalinas (…) Deixo-as como estalactites em meu poema, como pedacinhos de madeira polida, como carvão, como restos de naufrágio, presentes da onda… Tudo está na palavra…