Sign up with your email address to be the first to know about new products, VIP offers, blog features & more.

O que o tempo leva… (26)

Posted on

UMA NOVELA BLOGUEIRA – (Foto: Arquivo Pessoal)

 

“QUANDO não há mais nada a dizer, acreditem, é porque já se disse tudo” – máxima de Dona Lucinha, mãe de Lucilinda, e vida que segue…

 

– Ei! O que se passa? Estão loucos? Não é ele o meu noivo!

É a outrora doce voz de Lucilinda, agora áspera e cortante, quem intercede na defesa do outrora Fofo, e transforma o que seria um sacrifício num pesadelo bem maior do que o horror e as trevas de uma prisão.

– Não é ele meu noivo, já disse! É só um bom amigo.

(Tem coisa pior que a mulher amada lhe classificar como “um bom amigo”? Tem sim, vejam o que se segue…)

A essa altura da contenda, policiais em alerta, Felisberto em transe e o inevitável: juntou uma multidão nas imediações do Gera Park. Todos curiosos para saber do que se trata. Quem é o criminoso ou a criminosa, qual o delito?

Sem outro recurso, Luci ou Linda ou Lucilinda (ao que parece o codinome Lu já era) retira da enorme bolsa os documentos do veículo. Entrega ao policial em chefe que lê em voz alta para os demais ouvirem:

– O certificado de propriedade está em nome de um tal de… Vá checar, praça!

Outro policial se dirige até uma das viaturas com o papelete na mão e, de lá mesmo, confirma igualmente em voz mais alta ainda e pra todos ouvirem:

– Positivo, senhor. Nome do proprietário: Geraldo Freitas Camargo, casado, pai de dois filhos. De profissão, empresário, dono de uma rede de estacionamentos…

E, diremos nós, feliz proprietário também do coração de uma morena sestrosa de nome incomum, Lucilinda, tal e qual o porte e a formosura.

O romance do improvável casal Cacá e Lulu assim se torna escandalosamente público e, a partir de agora, notável e notório.

– Quer dizer, oficialmente, ainda não somos noivos. Marcamos o noivado para o início do ano, quando ele deixar a atual esposa. Só estamos esperando passar as festas de fim de ano porque, bem, deixa pra lá. Não interessa.

É Lucilinda a se explicar de um jeito que só uma Lucilinda pode se explicar.

A prova convenceu os policiais que dão o caso por encerrado.

– Puxa, foi um tremendo e lamentável engano.

Desculpa-se o chefete da operação.  As viaturas saem da mesma forma, cantando os pneus e abafando o burburinho da turba ignara. Que, registre-se, é só admiração e fofoca para (e sobre) os novos pombinhos da Vila Monumento e arredores.

Alguém se lembra de Felisba,  o ex-futuro, aquele que foi sem nunca ter sido.

A moça fica penalizada com a situação. Triste mesmo. Mas, como a distinta senhora sua mãe, Dona Lucinha, lhe ensinou, certa vez, prefere escafeder-se em silêncio:

“Quando não há mais nada a dizer, acreditem, é porque já se disse tudo”.

Entra no XR-3, dá a marcha ré, e lentamente, como se nada houvesse acontecido, vai embora partindo ao meio a multidão de intrometidos.

Aposto que vai se encontrar com o coroa – insinua o Tonhão, o chapa-quente, sem que ninguém o recrimine:

– Falei, falei, era muito areia pro caminhãozinho do panaca. Tinha que ter alguém comparecendo, ô, e alguém do pedaço. Aquele sorriso não é de alguém que está a seco.

Na cabine-residência, Felisberto se isola de tudo e de todos.

Não se apercebe do que acontece ao redor.

O gerente geral e único funcionário do Gera Park (desde já demissionário) não dá qualquer sinal de vida. Nem sequer tem forças para acender a luz.

Houve quem garantisse que ele chorava convulsivamente. Outros diziam que não. O silêncio era absoluto; vez ou outra, entrecortado por um murmúrio, quase lamento:

– Puxa, foi um tremendo e lamentável engano.

 

 

Ainda nenhum comentário.

O que você acha?

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *