UMA NOVELA BLOGUEIRA – (Foto: Jô Rabelo)
E FELISBERTO se aproxima de Lucilinda, a mulher da sua vida…
– Pois não, madame! Em que posso serví-la?
Felisba usa o melhor tom de voz, algo assim próximo aos antigos locutores da Rádio Eldorado que, por recomendação do patrão, ele era obrigado a ouvir diariamente no Gera Park.
(Ao menos agora a entendiante experiência lhe servia para algo.)
– Ah, Fofo, tô vindo morar aqui pertinho e vou precisar de um lugar para guardar meu carrinho. Ah, esqueci de dizer: meu nome é Lucilinda… Luci ou Linda, a gosto dos amigos.
O falar de Luci ou Linda, ainda está em dúvida como chamá-la, bate forte, tonteia, faz sonhar.
Ele, por ser o gerente geral, sabe bem que o estacionamento está mais do que lotado.
Em nenhum instante, por mas breve que fosse, passa-lhe pela cabeça deixar de atender à mulher da sua vida.
Sim, já, naquele preciso momento, Felisba estava certo que Luci ou Linda, ó dúvida cruel, era a mulher com M maiúsculo, a mulher da sua vida.
…
– Ora, ora, madame, estamos aqui para melhor servir aos clientes e amigos.
Felisba vai falando e, ao mesmo tempo, empilha, em pensamento, todos os carros, uns sobre os outros, para abrir uma vaga especial para o possante de Luci ou Linda (resolverá essa pendência, nos próximos parágrafos, promete a si mesmo).
Não foi preciso radicalizar, porém.
Lembrou-se do gringo, Sr. Ambrósio, que guarda o carro ali, mas passa férias na Praia Grande.
Ele deixou a chave no contato.
Ao menos nesta semana, é certo que ele não volta.
Pronto. Manobra daqui e dali.
Questão resolvida.
Felisba sente-se perdidamente apaixonado.
…
Papo vai, papo vem, a verdade é que tal encontro mudou radicalmente a vida de Felisberto, o gerente geral, manobrista e único funcionário do Gera Park-Vila Monumento a 500 metros do Monumento à Independência do Brasil. Ali, onde o Imperador, aquele mesmo que pousou em Bananal e hoje repousa, parcimonioso, ao lado das duas esposas, Dona Amélia e a Imperatriz Leopoldina.
Há quem diga que, pelas alamedas que unem o Monumento ao Museu do Ipiranga, em noites de lua cheia e avermelhada, é possível vislumbrar a silhueta da Marqueza de Santos, cantada em prosa e verso como único e verdadeiro amor da vida de Pedrinho I.
“No creo en brujas pero que las hay las hay”.
…
Voltemos ao Gera Park que lá está a paixonite do momento.
É claro e certo que Felisba deu um jeito de arranjar uma vaga para a fera da bela.
Pobre Sr, Ambrósio!
Quando chegou de viagem, o Opalão precioso (que tanto estima e cuida) estava que era só o pó.
Dormiu ao relento num canto descoberto do pátio do estacionamento.
…
Lucilinda, então, passou a ser presença constante por ali.
No mínimo, quatro vezes ao dia.
Pela manhã, às sete e quinze em ponto, quando vai para o trabalho.
E Felisba suspira.
Entra e sai na hora do almoço.
O atencioso funcionário faz questão de acompanhá-la na manobra e no ir-e-vir.
À noitinha, coisa de moça educada, antes das oito está guardando o Fusca.
Felisba a acompanha até o portão e certifica-se que entrou em casa a coisa de dois quarteirões distantes.
Ou seja, em toda a movimentação, faça chuva ou faça sol, ela conta com a atenção exclusiva (e calorosa) de Felisba.
…
É madame pra cá. Fofo, pra lá.
Risos, cumprimentos, breves conversas, comentários sobre o dia a dia.
Nada muito longo, é certo.
Mas, o básico e necessário para derreter o coração daquele que jurou não se meter em outra esparrela amorosa.
– Ah! Fofo, tive um dia daqueles. O telefone não parou de tocar.
– Eu, modestamente, também madame. Isso aqui entupiu de avulsos. Sabe como é, né? Foi uma loucura.
Ambos sorriem, com algum enlevo.
Será?
…
O que você acha?