Foi há coisa de dois três anos.
Dona Yolanda resolveu visitar a filha Rosa que mora em Vitória.
Passou uns dias por lá – e na volta, no alto de seus oitenta e tralalá, convocou os serviços do filho para busca-la no aeroporto de Congonhas.
Caros, vou lhes dizer.
Tomei um baita susto quando adentrei (gostaram do adentrei? – sempre me invoco com pessoas que preferem adentrar a simplesmente entrar; hoje porém não resisti — a ala de desembarque.
Pensei que estivesse adentrado (pronto, chega; gastei minha cota!) no túnel do tempo.
Verdade verdadeira.
Era manhã de sábado, clara; como ontem foi.
Havia uma penca de pré-adolescentes, eufóricas, entre gritinhos e a expectativa de que alguma celebridade estava preste a chegar.
Sei da popularidade da dona Yolanda no quarteirão onde mora, na Vila Planalto, mas não chegaria a tanto.
Olhei ao redor e descobri, logo atrás a multidão, um circunspeto senhor, ares de motorista profissional, segurando uma enorme placa que dizia, simplesmente:
RENATO E SEUS BLUES CAPS
Antes que aquela cena ganhasse contornos de delírios, por sorte identifiquei o grupo de jovens (para os padrões dos anos 60) senhores atravessar intacto a multidão, dirigir-se ao senhor do cartaz e, com ele, desaparecer pelo saguão do aeroporto.
Não preciso dizer, mas digo: aquele cidadão que passou, de bolsa de couro à moda e cabelos em cima da orelha e acaju, era o próprio Renato. Os demais deveriam ser novos e antigos “blues caps” que não fui capaz de distinguir.
Lembrei da cena hoje pela manhã a propósito do badalado show de logo mais de Paul McCartney em São Paulo.
Dizem que ele vai cantar alguns clássicos dos Beatles.
Daí me veio a ideia que os organizadores do megashow deveriam ter convidado o grupo carioca para fazer o ‘esquenta’.
Pode parecer maluca a ideia, concordo.
Mas, seria bem divertido, especialmente para quem tem mais de 50.
Explico:
Renato e Seus Blues Caps foi o grupo que mais emplacou versões para as músicas dos Beatles nos tempos da Jovem Guarda.
Querem ver?
“Menina Linda”, “Feche os Olhos”, “Você Não Soube Amar”, “Até o Fim”, “Ana”, “A Irmã do Meu Melhor Amigo”, “A Dona do Meu Coração”, entre outros sucessos, eram todos da matriz de Liverpool.
Entre nós, a turma dos suburbanos sonhadores, eram eles verdadeiros reis do iê-iêi-iê.
Adorávamos os Beatles e os Rollings Stones, mas cantávamos mesmo na pátria língua, sem qualquer pudor:
“Feche os olhos e sinta
Um beijinho agora
De alguém
Que não vive sem você…”
* Em tempo e a propósito: Poucos minutos depois, vi um pessoal com camisetas da MTV fazer um cordão de isolamento para abrir passagem a três ou quatro garotos imberbes, de roupas coloridas. Aí, sim, as tietes entraram em delírio, mas sem resultados práticos. Todos entraram ilesos na van que os levou dali. As mocinhas também se foram, deixando a ala vazia para que, enfim, a dona Yolanda pudesse chegar sem quaisquer transtornos.