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Tchinim em "8 ou 80"

Nunca entendeu por que a vó Ignês dizia que ele era “8 ou 80”. Até o dia em que Tchinim conheceu Cláudia na missa das oito no Colégio Marista Nossa Senhora da Glória, no Cambuci. Era irmã de outro aluno, o Paulinho, e morava na rua Muniz de Souza, assim como ele.

O garoto se apaixonou de pronto.

Os pensamentos rodopiaram e o coração acelerou descompassado.

O que estaria acontecendo? Nem após apostar corrida na calçada da rua Lavapés com os primos, empurrando a todos com jeito abestalhado, sentia-se assim…

“Deve ser o tal ‘80’ que a vó fala”, pensou.

II.

O fato é que, a partir daquele domingo, a celebração deixou de ser única e exclusivamente uma obrigação para jogar na ‘seleção’ do Colégio, uma determinação do Irmão Demétrius, que desempenhava diversas funções no Glória. Além de religioso, era professor, organizador dos torneios de futebol (que se jogava, entre classes, durante os 20 minutos do recreio) e principalmente técnico das duas seleções da escola – uma, até doze anos; outra, até 14 anos.

Becão valoroso e esforçado, Tchinim tinha doze anos; mas, às vezes, era convocado para jogar na turma com idade acima da dele. O que lhe dava certa popularidade entre os demais estudantes, quase todos amavam futebol e gostariam de integrar essas duas equipes.

Cláudia não se deu conta dos olhares do garoto. Nem antes, nem depois do santo ofício. Também não se interessava por futebol. Por isso, foi embora logo que a missa acabou.

Tchinim sentiu-se péssimo, sem ânimo. Pensou até em desistir de jogar naquela manhã.

Outra vez, lembrou na expressão da vó.

– Vixi, deve ser o tal ‘8’…

III.

Perdido por um, perdido por mil. Tchinim correu ao encontro de Paulinho e tentou convencê-lo a ficar para assistir ao jogo. Se possível com a irmã, lógico.

De novo, sentiu o coração disparar na expectativa da resposta, o tal ‘80’.

Mas, foi um pedido inútil.

Paulinho e Cláudia precisariam voltar logo. Antes das dez, pois sairiam para almoçar na casa de uma tia em Santo amaro, “longe pra chuchu”. Os pais estavam esperando.

O garoto teve ímpeto de acompanhá-los no caminho de casa. Só não o fez porque Paulinho falou demais.

– A mana também está com pressa. Acho que tem algum namoradinho por lá.

Putz. Outro sobressalto. Decepção. Sentiu-se a oito por hora…

IV.

Nem tudo estava perdido, porém.

A menina franziu a testa, e repreendeu o irmão.

– O que é isso? Falando de minha vida particular com um estranho.

Tchinim sentiu um amargo na boca. E uma fincada no coração. Mesmo assim, tentou preservar a esperança.

“Vocês voltam domingo”, perguntou.

Paulinho, já entendendo as intenções do amigo, respondeu que não.

Assistiriam à missa no Colégio Rainha dos Apóstolos, também no Cambuci, onde Cláudia estudava e…

– A gente volta, sim, disse ela. – Passo lá a semana toda, é bom vir aqui de domingo e conhecer gente nova.

Falou, e deu um ligeiro sorriso ao garoto que, naquela manhã, jogou o que sabia e o que não sabia. Só pensava na missa do próximo domingo.

Tinha razão a vó Ignez. Era 8 ou 80 na vida, e nos amores…