Troquei de óculos para escrever este post.
Dei folga para o multifocal que uso e peguei os óculos de leitura do Velho, o último presente que lhe dei num remoto e alegre Dia dos Pais.
Ele tinha um par de óculos de estimação, já entrado em décadas. Há alguns meses, a haste da esquerda pifara, ficara bamba e não houve ótica que desse jeito.
Por mais que o atendente lhe dissesse não haver conserto, o pai teimou e insistiu.
Trouxe a armação de volta e, já em casa, lhe aplicou um remendo à base de superbond e esparadrapo que, apesar do aspecto desolador, deu o resultado esperado.
Uma única questão atrapalhou a perfeição do engenho.
A haste ficou rígida, imexível, como diria aquele ministro.
Como, então dobra-la, para guardar os óculos no bolso?
Outra vez, o Velho tratou de achar uma solução. Nem precisou ser tão criativo assim.
Arranjou um desses cordões apropriados para tal fim. E, a partir de então, todo orgulhoso de si, levava o dito-cujo ao peito, como se fosse uma medalha olímpica.
Sempre que alguém falava que ele precisava de óculos novos, ele desconversava. Falava do amor ao Palestra, dos amigos da fila dos aposentados, da centena que jogara no “bicho”.
— Um dia eu acerto, e quebro a banca.
Numa manhã de sábado, na semana anterior àquele Dia dos Pais, o convenci a ir ao shopping comigo. Usei como pretexto que iríamos tentar consertar o velho cronômetro do tempo em que ele trabalhava na Casa López. Ou seja, década de 40.
O Velho fingiu acreditar na minha conversa.Tanto que sequer levou consigo o relógio estimação. Assim que chegamos à ótica, não se fez de rogado. Experimentou alguns modelos até que escolheu este que uso agora para ver o que acabo de lhes escrever. Um dos mais em conta.
— Não quero dar prejuízo para o garotão aí.
O garotão era eu que já nem era tão garoto assim.
O pai disse a frase e sorriu aquele riso sereno de quem vê a vida pelas lentes do amor.
* Feliz Dia dos Pais a todos
