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A frase e o segredo

Foto: Arquivo Pessoal

“Não sei o que certas pessoas têm na cabeça.”

Lembro que, certa feita, comecei uma das minhas reportagens com a frase acima – e os amigos-repórteres estranharam como o então copydesk havia deixado passar.

(Pois é, amigos, naquela época, havia jornalistas mais experientes que davam um trato final no texto dos apressados repórteres antes da publicação. Tudo era revisado, checado etc etc. Old times!)

Não sei qual a insanidade que retratei na matéria.

A propósito, insanidades é o que não faltam no risque-e-rabisque deste nosso Brasilzão (nem sempre) abençoado por Deus e bonito por natureza.

Mas, tasquei a frase – e assim saiu no jornal do dia seguinte.

Soube que, além do coppy, a chefia achou original (e cabível) a solução dada pelo então jovem repórter.

Imprimia um tom pessoal à reportagem.

Chamava a atenção – e, disseram então, trazia até um tom interativo à narrativa.

Fiz a egípcia.

Fiquei na minha.

Agradeci os elogios.

Banquei o modesto, mas não revelei a real, o segredo magno.

Ok!

Passado tantos e tantos anos, me sinto confortável em lhes contar a verdade.

Que, diga-se, é a mais banal possível.

Toda vez que empacava no início de um texto – e a pauta sugeria algo fora de controle a tangenciar o absurdo – eu cravava ali no início, a título de epígrafe, o sentimento que me ocorrera durante a coleta das informações:

“Não sei o que certas pessoas têm na cabeça” – era uma das frases preferidas.

Havia outras. Tipo:

“Que falta de absurdo!”

“Sem noção.”

E por aí seguia…

A partir dessa constatação particular começava a relatar o fato e os personagens envolvidas.

Dou um ‘por exemplo’:

“O prefeito Fulano de Tal anunciou pôs a culpa em São Pedro pelas fortes chuvas que ocorreram ontem em São Paulo e foram a causa de mais essa inundação etc etc etc…”

Diria que funcionava como um talismã para dar fluência e encontrar o tom exato das palavras.

Depois de pronta a reportagem, eu riscava a frase em epígrafe – e tudo ficava dentro dos conformes. Vida que segue…

Naquela noite, um vacilo: esqueci de me apagar a malfadada abertura.

Deu no que deu…

Lembrei a história hoje…

Não sabia o que lhes escrever.

Ando raso de ideias e querendo distância das tristezas que leio em nossos noticiários.

Pensava nessas mazelas todas travado diante da tela em branco.

Naturalmente a frase me veio à mente

“Não sei o que certas pessoas têm na cabeça.”

E pronto:

Eis que, como nos velhos tempos, a partir dela, desenrolei o texto de hoje.

* Trinta e quatro anos sem Raulzito. Nossas reverência e saudades.

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