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João Paulo II e as pedras do caminho

01. O Brasil sempre foi considerado o maior país católico do mundo. Talvez motivada por nossa natural tendência ao exagero, uma dúvida me acompanha — e juro por todos os santos — é inevitável quando ouço essa e outras frases do tipo "Deus é brasileiro". Nessas horas, parece-me que estamos a imputar ao destino — ou melhor seria dizer, aos desígnios do Senhor — uma culpa que nos pertence, direta ou indiretamente, para os chamados desajustes sociais que ora vivenciamos. "O Céu que nos proteja…" é outro dito que me deixa encafifado. Seria normal se esperar que, invocada a proteção divina, nada mais é preciso fazer senão esperar por novos amanhãs mais promissores. "Se Deus está por nós, quem será contra?" É o que nos basta…

02. Faço esse preâmbulo, que considero delicado por tratar de uma questão de fórum pessoal, para falar da terceira visita do papa João Paulo II ao Brasil. Ele chegou ontem ao Rio, 17 anos depois de sua primeira estada por aqui e seis anos após a segunda. É sua 80a. viagem ao Exterior, um desafio para o organismo debilitado pelo passar do tempo e por doenças crônicas. Oficialmente vem participar do Encontro Mundial do Papa com as Famílias. No entanto, todos reconhecem, seu empenho, mesmo aos 77 anos, em referendar pessoalmente o trabalho humanista que caracteriza os quase 19 anos de pontificado. "Será uma oportunidade inigualável de reflexão", disse ele, em português, antes de embarcar em Roma.

03. João Paulo II é um contumaz defensor das tradições da Igreja, especialmente na área comportamental. Condena, por exemplo, o uso da pílula anticoncepcional, o controle demográfico, o divórcio e as relações sexuais fora do casamento. Essa postura nitidamente conservadora contrasta com a modernidade da disponibilidade que, diga-se, sempre demonstrou ao visitar diversos países nos quatro cantos do mundo e, em lá chegando, não se constranger em tocar, com firmeza, em assuntos locais, sempre em favor dos desassistidos. É muito provável que o tema reforma agrária faça parte da pauta dos assuntos que o Papa vai desenvolver na manhã de hoje quando se encontrar com o presidente Fernando Henrique Cardoso. Um assunto certo do encontro, que vai causar arrepios na primeira-dama, dona Ruth, será o projeto de lei que autoriza o aborto em caso de estupro ou risco de morte da gestante, ora em tramitação no Congresso.

04. O Papa fica entre nós por quatro dias, mais especificamente no Rio de Janeiro. Depois retorna ao Vaticano e para os inacessíveis aposentos eclesiásticos. Enquanto estiver por aqui, os olhos de 2 bilhões de pessoas estarão voltados para o Sumo Pontífice e para nós. Milhares de jornalistas e técnicos de rádio e TV de toda a parte do Planeta Terra invadirão a então Cidade Maravilhosa durante a semana para cobrir em detalhes e nuances da honrosa visita. Serão momentos de fé e emoção, inesquecíveis para muitos de nós, católicos apostólicos e romanos. Mais do que um megaevento televisivo, a benção papal, certamente, vai iluminar nossos passos. Mas, é fundamental, que continuemos a caminhada, sabedores que cabe a nós retirar as pedras que diariamente encontramos pela frente.

05. Vamos aprender com João Paulo II a transcender os limites e renovar forças e coragem em nome de um ideal maior em prol da Humanidade, mesmo com nossas contradições. Deus estará por nós, sim, sempre que estivermos com Ele.